sábado, 28 de maio de 2011

MADAME GUYON - 2ª Parte - Experimentando as Profundezas de Jesus Cristo Através da Oração

3. As Profundezas – Mesmo Para os Iletrados

Aqueles que não podem ler, não estão excluídos da oração. O grande livro que ensina todas as coisas, escrito por toda sua extensão, por dentro e por fora, é o próprio Jesus Cristo.
O método que devem praticar é o seguinte: Em primeiro lugar, assimilem esta verdade fundamental: "O Reino de Deus está no meio de vós" (Lc 17.21) e somente ali deve ser procurado.
O clero foi encarregado de transmitir esta verdade aos fiéis, tanto no catecismo como na oração. É bem verdade que pregam sobre a finalidade da criação do homem, mas não fornecem instruções suficientes de como alcançá-la.
Os fiéis devem ser ensinados, desde o princípio, por um ato de profunda adoração e anulação diante de Deus: fechem os olhos corporais e abram os da alma; reconheçam interiormente, através de uma fé viva, o Deus que habita ali; penetrem na presença Divina, sem permitir que os sentidos se desviem, mas mantendo-os submissos o quanto possível.
Repitam a oração do Senhor, na língua materna, ponderando sobre os significados das palavras e sobre o infinito desejo do Deus interior de tornar-Se, de fato, SEU PAI. Neste estado, derramem suas necessidades diante Dele e ao pronunciarem a palavra Pai, permaneçam por alguns minutos em silêncio reverenciai, esperando surgir aquele desejo de que o Pai celestial seja manifestado.
Mais uma vez, o Cristão, num estado de frágil criança, endurecida e machucada por repetidas faltas, sem forças para resistir, ou sem poder de purificar a si próprio, deve colocar sua deplorável situação diante dos olhos do Pai, em humilde vergonha, inserindo algumas palavras de amor e pesar; mergulhando novamente no silêncio diante Dele. Continuem então a oração do Senhor, implorando a este Rei da Glória para que reine em cada um de vocês; abandonem-se em Deus, a fim de que Ele possa habitar em vocês e reconhecer seu Direito de governar.
Se sentirem uma inclinação à paz e ao silêncio, não continuem com as palavras da oração enquanto perdurar esta sensação; quando ela diminuir continuem com a segunda petição: "SEJA FEITA A VOSSA VONTADE ASSIM NA TERRA COMO NO CÉU"; permitam assim, humildes suplicantes, que Deus realize em vocês e através de vocês a Sua vontade, entreguem os corações e a liberdade nas mãos de Deus, para serem dispostos como Lhe aprouver. Quando descobrirem que a vontade deve ser empregada amorosamente, desejarão amar e implorarão a Deus pelo seu AMOR; tudo isso ocorrerá doce e tranqüilamente; o mesmo se aplica ao resto da oração.
Não se sobrecarreguem com repetições freqüentes de fórmulas ou orações decoradas, pois a oração que o Senhor nos ensinou, uma vez realizada como acabo de descrever, produzirá frutos abundantes.
Em outros momentos, poderão se colocar como ovelhas diante de seu Pastor, buscando o verdadeiro alimento: "Oh, divino Pastor, tu alimentas teu rebanho de ti mesmo, sendo, de fato, o pão diário". Mostrem a Ele as necessidades de seus familiares: mas que tudo seja feito a partir do princípio e da grande visão de fé, de que Deus está dentro de cada um.Todas as imaginações sobre Deus não levam a nada; uma fé viva em sua presença, basta. Pois, não devemos formar nenhuma imagem da Divindade, embora possamos formar uma imagem de Jesus Cristo, observando seu nascimento, crucificação ou algum outro estado ou mistério, fazendo com que a alma O busque sempre em seu próprio centro.
Em outra oportunidade, podemos buscá-Lo como a um Terapeuta, apresentando à Sua virtude curadora, todas as nossas doenças, mas sempre sem perturbações e com pausas de tempo, a fim de que o silêncio seja intercalado com a ação e gradualmente estendido; para que nosso próprio esforço seja ouvido, até que pelo contínuo apelo pelas operações divinas, com o tempo, Ele obtenha a completa ascendência, como explicaremos mais adiante.
Quando a presença divina nos é confiada e gradualmente começamos a apreciar o silêncio e o repouso, este desfrutar experimental da presença de Deus introduz a alma no segundo grau da oração, que realizada pelos procedimentos descritos acima, é alcançada tanto por analfabetos, como por eruditos; algumas almas privilegiadas, de fato, são favorecidas por esta presença, desde o início.

4. O Segundo Nível

Alguns chamam o segundo nível da oração de  Contemplação, a oração da fé e da quietude; outros o chamam de Oração da Simplicidade. Devo usar aqui esta segunda denominação, por ser mais justa que a primeira, a qual implica num estado mais avançado do que aquele que tratando agora.
Quando a alma é exercitada por algum tempo no caminho mencionado, gradualmente descobre ser capaz de abordar a Deus com facilidade, que o recolhimento é conseguido com menos dificuldades e que a oração torna-se fácil, doce e prazerosa; reconhece que este é o verdadeiro caminho para encontrar a Deus e sente que "teu nome é como um óleo escorrendo" (Ct. 1.3). O método deve ser alterado neste momento, e o que aqui descrevo deve ser buscado com coragem e fidelidade, sem deixar se abater pelas dificuldades do caminho.
Primeiro, uma vez que a alma, através da fé se coloque na presença de Deus e se alinhe diante Dele, deve permanecer assim por alguns instantes, em respeitoso silêncio. Mas, se no começo, ao formar o ato de fé, sentir uma pequena e agradável sensação da presença Divina, permaneça assim, sem perturbação, nutrindo esta sensação pelo tempo que puder. Quando ela diminuir, estimule a vontade através de algum sentimento carinhoso; caso a doce paz seja restabelecida, que assim permaneça; o fogo deve ser ventilado gentilmente, mas uma vez aceso, é preciso diminuir os esforços, ou o extinguiremos com a nossa atividade.
Recomendo que nunca terminem a oração sem permanecer um tempo em respeitoso silêncio. É muito importante para a alma dirigir-se à oração com coragem e trazer consigo um amor puro e desinteressado, que não busca nada de Deus, senão agradá-Lo e fazer a Sua vontade; pois um servo que mede seus esforços apenas pela recompensa, não é digno de recompensa alguma. Dirija-se à oração, não esperando desfrutar dos deleites espirituais, mas para estar exatamente da forma que agrada a Deus. Isto irá preservar seu espírito tranqüilo tanto na aridez como na consolação, evitando que seu ser seja surpreendido com a aparente ausência ou rejeição de Deus.

5. Períodos de Sequidão

Ainda que Deus não tenha outro desejo além de conceder-Se à alma amorosa que O busca, Ele freqüentemente Se oculta dela, a fim de que a alma seja despertada da lentidão e impelida a buscá-Lo com fidelidade e amor. Mas com que imensa bondade recompensa a fidelidade de seus bem-amados! E quão freqüente Suas aparentes retiradas são sucedidas por carícias de amor.
Nestes momentos, temos a tendência de acreditar que ele prova a nossa fidelidade e mostra a necessidade de maior ardor de sentimento ao buscá-Lo, através de nossas próprias forças e atividade e que isso O induzirá a nos revisitar mais rapidamente. Não, queridas almas, acreditem, este não é o melhor caminho neste estágio da oração. Espere o retorno do Amado com amor paciente, autonegação e humildade; com o fôlego renovado de um sentimento ardente, mas pacífico e com um silêncio repleto de veneração.
Demonstre assim, que procura somente a Ele e seu júbilo, não os deleites egoístas de nossas próprias sensações ao amá-Lo. É dito: "Endireita teu coração e sê constante, não te apavores no tempo da adversidade. Une-te a ele e não te separes, afim de seres exaltado no teu último dia". (Eclo 2 2,3).
Seja paciente na oração, embora durante todo o período de tua vida não tenhas outra coisa a fazer que esperar o retorno do Amado num espírito de humildade, abandono, contentamento e resignação. Mais que tudo, em perfeita oração! A vida será intercalada com sinais de amor pleno! Esta conduta é mais agradável ao coração de Deus e irá, acima de outras, forçar O seu retorno.

6. Abandono

Neste ponto, devemos começar a Abandonar e a Entregar toda a nossa existência a Deus, com a forte e positiva convicção, que as ocorrências momentâneas resultam de sua vontade imediata e permissão, e são exatamente o que o nosso estado necessita. Tal convicção nos fará sentir felizes com todas as coisas; nos fará considerar tudo o que acontece, não do ponto de vista da criatura, mas do ponto de vista de Deus.
Mas, queridos e amados, quem quer que queira se entregar sinceramente a Deus, eu vos imploro a não se retirarem após terem feito a doação; lembrem-se: um presente dado não mais está à disposição de quem o deu.
O abandono é uma questão de grande importância para o progresso; é a chave para a corte interior, de modo que aquele que sabe verdadeiramente se abandonar, rapidamente atinge a perfeição. Devemos, portanto, continuar firmes e imóveis, sem dar ouvidos à razão natural. Uma grande fé produz grande abandono; devemos confiar em Deus, "esperando contra toda esperança" (Rm 4,18).
Abandono é perder os cuidados egoístas, para que possamos estar todos ao dispor divino. Todos os cristãos são exortados ao abandono, pois é dito: "De fato, são os gentios que estão à procura de tudo isso: o vosso Pai celeste sabe que tendes necessidade de todas essas coisas." (Mt 6,32). "em todos os teus caminhos, reconhece-o, e ele endireitará as tuas veredas" (Pr 3,6). "Recomenda a Iahweh tuas obras, e teus projetos irão se realizar" (Pr 16,3). "Entrega teu caminho a Iahweh, confia nele, e ele agirá" (SI 37,5).
Portanto, o abandono deve ser tanto ao que diz respeito as coisas internas como externas; abandonar absolutamente todas as preocupações nas mãos de Deus, esquecendo de nós e lembrando somente Dele, por quem o coração permanecerá sempre desimpedido, livre e em paz.O abandono é praticado com o contínuo abandonar da vontade própria na vontade de Deus; renunciando toda inclinação particular, tão logo surja e por melhor que possa parecer, a fim de permanecermos indiferentes com relação a nós mesmos, desejando apenas aquilo que Deus tem desejado desde toda eternidade; nos resignando em todas as coisas, tanto do corpo como da alma, temporária ou eternamente; esquecendo o passado, deixando o futuro para a Providência e devotando o presente a Deus; estejamos satisfeitos com o momento presente, que traz consigo a ordem eterna de Deus; trata-se de uma infalível declaração da Sua vontade, na medida em que é inevitável e comum a todos; que nada do que nos aconteça seja atribuído à criatura, mas a Deus; vejam todas as coisas, exceto os nossos pecados, como infalivelmente procedentes de Deus.
Entreguem-se, então, à orientação e a disposição de Deus, tanto no que se refere ao estado exterior, como interior.

Continua.....


Pesquisa: Pr.Charles Maciel Vieira

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