“A Curva do S, no Alto da Boa Vista, na Zona Norte do Rio, ganhará status de Espaço Sagrado”, revela a sessão Comportamento da revista Isto É (Edição 2303, de 15/1/2014). Motivo? Segundo Mariana Brugger, que assina a matéria “Um macumbródomo para o Rio”, a inexistência de um local adequado para os rituais da umbanda e do candomblé ocasiona sujeira em áreas urbanas, de preservação ambiental e, como consequência, incorre em “perseguição” por parte de seguidores de outras crenças e ecologistas. Solução: a Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Rio de Janeiro decidiu reservar uma área de 4.500 m², na Curva do S, ao custo de R$ 1 milhão de reais, proveniente dos cofres públicos. O macumbódromo deverá abrigar, segundo o secretário Carlos Minc, 15 recantos decorados com totens, de acordo com as características dos orixás, duas entradas com placas orientando o comportamento esperado dos visitantes e usuários e 2 banheiros públicos.
Minc disse ter sido procurado por secretários de outros Estados para compartilhar a experiência. “Outras duas áreas do Rio deverão receber Espaços Sagrados”, declara Minc, que também ressalta que “dessa forma será possível (aos praticantes) fugir de santuários e parques privados que cobram pela entrada para a prática de cultos”. Também será uma forma de diminuição nos impactos ambientais, decorrentes das oferendas deixadas aos orixás. Sustentável? Bom, é discutível! Agora: é constitucional? Ou melhor: preserva o princípio de Estado laico? Experiências do passado – dos três primeiros séculos do Brasil -, como a do Regime do Padroado, são exemplos de como o Governo agia no sentido de manutenção da religião dominante: a Igreja Católica Romana.
Estabelecido antes do achamento de Pindorama (Brasil, a partir de 1503), o Regime do Padroado dava à coroa portuguesa autorização para construir templos e mosteiros, dotá-los de padres e religiosos e, principalmente, nomear bispos. O clero fazia parte do funcionalismo público, remunerado pelo Estado (vide PIERUCCI, O Livro das Religiões, p. 281). Promovida pelo Estado, a Igreja se espalhou por todo o território, mantendo significativa influência sobre o Governo até 1889. Com a República, o Catolicismo passa a atuar de maneira autônoma em relação ao governo central. O ponto principal da transição monarquia-república foi o não mais financiamento da Igreja com dinheiro público; há uma exceção, que é o destino de vertas do Ministério da Cultura para manutenção do patrimônio histórico – o que inclui, obviamente, templos católicos dos três primeiros séculos, mas também mesquitas, igrejas protestantes históricas e casas de candomblé. E é só!
O grande problema com relação aos Espaços Sagrados – e que, embora aberto a 200 representantes de terreiros na elaboração do projeto, não é um procedimento, diríamos, de um governo laico, pautado nas Constituições de 1891 e a de 1988 – privilegia um seguimento religioso em detrimento a tantos outros presentes no Rio de janeiro, como os evangélicos. Novamente: é um processo que fere o Laicismo. Mas não é o único problema no Estado. O ensino religioso – diferente de São Paulo, que utiliza o ensino da História das Religiões – no Rio de Janeiro o ensino é confessional. “É um investimento errado”, ressaltou Yvonne Maggie em sua coluna no portal G1, em março de 2012. Maggie registrou que o município passaria a gastar mais de 16 milhões com o projeto, e que a iniciativa seguia uma orientação estadual. “Desde 2000 já havia sido sancionada uma lei implantando o ensino religioso confessional nas escolas”, lembra Maggie.
O Estado do Rio de Janeiro, segundo último censo do IBGE de 2010, é multirreligioso, multirracial. E não é uma novidade: já em 1904 o jornalista João do Rio relata à Gazeta de Notícias a presença de um emaranhado de confissões religiosas, como protestantes históricos – particularmente presbiterianos, batistas, metodistas -, além de adventistas, espíritas, israelitas, cartomantes e até mesmo um exorcista católico que atendia no morro do Castelo – e isto a apenas 13 anos da publicação da Constituição de 1891, que colocava fim ao Regime do Padroado e dava liberdade jurídica a todas as religiões. As reportagens – posteriormente reunidas em um livro por Paulo Barreto, As Religiões do Rio, e hoje disponível pela José Olympio Editora – também serve de base para a discussão da situação do Catolicismo Romano naquele período (ver Livraria Cultura).
É evidente que o Rio de Janeiro possui hoje a maior proporção de espíritas do País – algo em torno de 4% – e que, embora tenha se estruturado no Estado e depois perdido espaço para a Bahia, no período da Monarquia (PIERUCCI), retomou seu crescimento a partir da primeira metade do século XX, impulsionado por movimentos paralelos, como a umbanda, que se desenvolve entre as décadas de 20 e 30 e tem seu pico em 1941, com a realização do Primeiro Congresso Umbandista, na cidade do Rio de Janeiro. O candomblé também encontraria espaço no Estado, desde o final do século XIX, embora sua predominância maior seja na Bahia. O Rio de Janeiro também é palco do crescimento estrondoso do movimento evangélico – particularmente pentecostal e neopentecostal – e de outros movimentos religiosos de origem norte-americana, como mórmons e testemunhas de Jeová.
A construção de espaços exclusivos para rituais da umbanda e do candomblé também deveria ser seguido pela construção de espaços exclusivos para cultos evangélicos – principalmente após a proibição de pregação em trens e dos altos índices de criminalidade que põe em risco igrejas que realizam orações em áreas afastadas do centro, como em montes e em regiões da Floresta da Tijuca. Seria razoável, mas o ideal mesmo é que o Estado se mantenha distante de denominações religiosas, não investindo dinheiro público que poderia ser utilizado para a construção de conjuntos habitacionais e abrigar famílias que moram em áreas de risco da região serrana. O Estado concede muitos benefícios à religião ao não cobrar certos impostos e ao transferir recursos para casas de “recuperação” que sequer prestam um atendimento básico aos pacientes. O Estado deve ser laico.
Por Johnny Bernardo
é pesquisador, jornalista, colaborador de diversos meios de comunicação e licenciando em Ciências Sociais pela Universidade Metodista de São Paulo. Há mais de dez anos dedica-se ao estudo de religiões e crenças, sendo um dos campos de atuação a religiosidade brasileira e movimentos destrutivos. Contato: pesquisasreligiosas@gmail.com Google Plus
Fonte: http://colunas.gospelmais.com.br/
Palavra e Teologia, Tudo concernente a Biblia, Teologia e vontade de Deus na vida do homem, escritos apocalipticos biblicos, arqueologia biblica e geral, Teologia Biblica e uma palhinha de Sistematica. Palavraeteologia. Word and theology, all concerning the Bible, Theology and the will of God in man's life, apocalyptic biblical writings, biblical archeology and general Biblical Theology for Systematics and a straw. Palabra y la teología,la Biblia, la Teología, escatología.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário