Definir um termo
como "cultuar" ou "adorar" não deixa de ser um desafio a
todos que se preocupam com uma verdadeira adoração. Por um lado, num sentido
mais restrito, significa uma atribuição de honra e glória a quem ou ao que o
adorador considera de valor supremo. Seria veneração ou devoção expressa a Deus
em público ou pessoalmente. Por outro
lado, pensa-se, popularmente, que adoração requer uma expressão visível, a
prática de ritos religiosos que identificam a sua forma Vejamos algumas formas
variadas.
1. O culto
carismático caracteriza-se por manifestações emocionais, sonoras, visíveis,
mostrando a atitude dos adoradores em relação a Deus. A forma do culto se
distingue pelo levantamento dos braços, exuberantes gritos de
"aleluia", movimentos corporais e "cânticos espirituais",
manifestando entusiasmo na maneira de glorificar a Deus. A comunicação
cognitiva tem menos importância em comparação com a livre participação daqueles
que cultuam.
2. O culto didático
e pedagógico concentra a atenção dos participantes na centralidade da Palavra
de Deus. Pela pregação, ensino e exortação, espera-se que os assistentes ouçam
a voz de Deus pelo recado recebido e sejam convencidos de que devem oferecer a
Deus, como Senhor, tudo que Ele exige e merece. As igrejas batistas e
presbiterianas exemplificam principalmente a adoração didática
3. O culto
eucarístico valoriza o culto por meio da Ceia do Senhor. A Eucaristia
representa o cerne da aproximação entre Deus e o cultuante. Por meio da
participação nesse "sacramento" memorial, a mística do material unido
ao espiritual toma a sua forma concreta para quem celebra a dramatização da
morte sacrificial de Jesus Cristo. Espera-se a criação dum espírito de gratidão
e devoção nos participantes. As igrejas luteranas, anglicanas, e católicas
apresentam um só quadro na importância que atribuem ao culto eucarístico.
4. O culto
kerugmático (vem do vocábulo grego kerugma, que significa
"proclamação") focaliza a atenção sobre a evangelização dos
não-convertidos. As diversas partes do culto são escolhidas e preparadas para
levar os espiritualmente perdidos a se entregarem a Jesus Cristo. Cultos
evangelísticos são valorizados pelos evangélicos que concebem como a principal
responsabilidade da igreja cumprir a missão que Jesus deu aos Seus discípulos
(Mt 28.19), uma missão que deve ser levada a efeito dentro e fora do recinto de
culto.
5. Outros cristãos
modernos concentram a sua comunhão uns com os outros. Torna-se popular a
descrição deste culto como "corpo vivo" (body-life), porque procura-se
a partipação mútua de todos. A. Neely, professor de missões no Seminário de
Wake Forest, E.U.A., sugere o termo koinoniático (do grego koinonia,
"comunhão", "participação") para indicar essa qualidade
central no culto. Como o corpo humano necessita dar e receber a contribuição de
suas diversas partes constituintes, assim muitas igrejas estão recuperando a
ênfase primitiva apresentada no Novo Testamento sobre a mutualidade.
6. O culto
diakonal. Segundo este conceito, Deus é visto somente no irmão necessitado, sem
nos preocuparmos se ele é realmente membro da família do Senhor. Baseia-se nas
palavras de Jesus: "... vinde, benditos do meu Pai!... Porque tive fome e
me destes de comer... Então perguntarão os justos: Senhor, quando foi que te
vimos com fome e te demos de comer? ou com sede e te demos de beber? E quando
te vimos forasteiro e te hospedamos? ou nu e te vestimos? E quando te vimos
enfermo ou preso e te fomos visitar? O Rei, respondendo, lhes dirá: Em verdade
vos afirmo que sempre que o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim
o fizestes." {Mt 25.24-40). Assim, boas obras, caridade, atos de compaixão
em favor dos que sofrem e dos oprimidos, passam a ser expressão de culto ao
Senhor. Outros, que seguem uma linha mais radical, como os adeptos da Teologia
da Libertação", vão mais longe. Apóiam movimentos anti-imperialistas e
identificam as estruturas direitistas como inimigas. Cultuar, para eles, pode
até envolver a luta política contra a injustiça de uma sociedade denominada
"reacionária" e "decadente".
Todos estes modelos
característicos de culto, formados por séculos de tradição, ou então por
modernas reações contra um formalismo herdado do passado ou importado de terras
alheias, têm um fator comum. Expressões de adoração como as aqui mencionadas
caracterizam as formas de cultuar, e não medem a realidade ou grau de
espiritualidade do adorador. Qualquer que seja a expressão do culto ou rito
como veículo de adoração, a sua forma é externa, mas a atitude do coração é
interna, muitas vezes oculta da própria percepção do adorador.
Deus preocupa-se
mais com o coração do que com a forma, ainda que as Escrituras não admitam uma
dicotomia entre corpo e espírito. É o próprio Deus quem toma a iniciativa na busca de verdadeiros adoradores. Ele deu
Seu Filho para revelá-lO (Jo 1.18), para sacrificar-se em oferta expiatória,
assim rasgando o véu que separava o Lugar Santo do Santo dos Santos (Mt 27.51;
Mc 15.38 e Lc 23.45). Jesus deixou o caminho livre para os pecadores se
aproximarem do Pai santíssimo (Jo 14.6). Deus cumpriu a promessa proclamada
pelos profetas, de derramar Seu Espírito sobre Seus filhos (Ez 36.27). Somente
por meio do Espírito é possível oferecer culto verdadeiro a Deus (Jo 4.24; Fp
3.3). Este fator central da adoração é invisível. A forma correta de adorar não
garante que estejamos adorando "pelo Espírito" (o termo pneumati [Fp
3.3], em grego, está no dativo instrumental, "por meio do Espírito").
Assim, Deus tem de revelar-se no Filho, perdoar os pecados que nos separam dEle
e dar-nos o Espírito para que pela Sua assistência possamos responder-Lhe. Deus se aproxima de nós no Filho, e nós nos
aproximamos dEle no Espírito. Nenhuma dessas realidades pode ser demonstrada
por uma expressão externa de culto. Atos religiosos, tais como falar "as
línguas dos homens e dos anjos", ou "distribuir todos os bens entre
os pobres", ou ainda entregar "o próprio corpo para ser
queimado" (1 Co 13.1-3), não expressam necessariamente um amor real. O
mesmo acontece com a adoração; os atos externos mais notáveis podem facilmente
enganar.
Desde seu começo, o
culto cristão tem sido ameaçado por dois perigos: 1) Um formalismo que
sacramenta o modo de adorar a Deus, enquanto anula o poder de um contato vital
com Deus (cf.2 Tm 3.5) e 2) Uma espontaneidade que encoraja desprendimento e
liberdade, desprezando toda e qualquer forma, mas que cria confusão e desordem.
Ambas as formas de culto são condenadas pela falta de amor. O formalismo busca
o amor pelo Pai celeste enquanto o informalismo desordeiro desvaloriza os
filhos da Sua "família". A igreja de Éfeso, possivelmente, ilustra o
primeiro perigo, tendo abandonado seu primeiro amor (Ap 2.2-5). Preocupava-se
com a forma e em manter boas aparências, mas esquecia-se do principal - o amor.
Pode-se verificar o segundo perigo na vida espiritual da igreja de Corinto. A
liberdade teve ascendência, reinando com supremacia, enquanto a verdadeira
adoração sofreu um eclipse por causa das divisões. A desordem caracterizou a
Ceia do Senhor. Nas reuniões da igreja, um irmão qualquer tomava a palavra sem
se dar conta de que outros profetas também tinham mensagens para comunicar (1
Co 14.29-30).
FONTE: Adoração
Bíblica - Dr. Russel P. Shedd
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