sexta-feira, 20 de maio de 2011

TORTURADO POR AMOR A CRISTO - 2ªParte-RICHARD WURMBRAND


Meu Ministério entre os Russos

Por causa do meu remorso de ter sido ateu, ansiava, desde o primeiro dia da minha conversão, poder teste­munhar aos russos. Os russos são um povo educado, desde a meninice, no ateísmo. Meu desejo de testemu­nhar aos russos já foi consumado. Sua realização come­çou nos tempos nazistas, porque tínhamos na Romênia muitos milhares de russos como prisioneiros de guerra e podíamos fazer trabalho evangelistico entre eles. Era um trabalho dramático e muito comovente. Nunca me esquecerei do meu primeiro encontro com um prisio­neiro russo. Ele me havia dito que era engenheiro. Per­guntei-lhe se cria em Deus. Se ele houvesse dito "não", jamais me incomodaria tanto. É direito de cada homem crer ou descrer. Porém quando lhe perguntei se cria em Deus, ele levantou os olhos para mim, sem me enten­der, e disse: "Não tenho ordem militar para crer. Se eu tiver uma ordem, crerei".
Lágrimas correram no meu rosto. Senti meu cora­ção quebrantado. Diante de mim estava um homem com uma mente morta, um homem que havia perdido o maior dom que Deus dera à humanidade — o de ser um indivíduo. Ele havia passado por uma lavagem cere­bral e se tornado um instrumento nas mãos dos co­munistas, preparado para crer ou não em uma ordem. . Não podia mais pensar por si próprio. Era um russo típico depois de todos esses anos de domínio comunista! Depois do choque de ver o que o Comunismo tem feito com a pessoa humana, prometi a Deus dedicar a minha vida a estes homens, para trazer-lhes de volta sua per­sonalidade e dar-lhes fé em Deus e em Cristo.
Não foi preciso ir à Rússia para pregar aos russos.
A partir do dia 23 de agosto de 1944, um milhão de soldados russos entraram na Romênia e logo após os comunistas assumiram o poder do nosso país. Então começou um pesadelo que fazia o sofrimento sob o Na­zismo parecer nada.
Naqueles dias, na Romênia que tinha uma popu­lação de 18 milhões, o Partido Comunista possuía apenas 10 mil membros. Entretanto, Vishinsky, Secretário do Exterior da União Soviética, intempestivamente entrou no gabinete do nosso mui querido Rei Miguel I e, esmur­rando a mesa, disse: "Você tem de nomear comunistas para o Governo". Nosso exército e polícia foram desar­mados e, desta maneira, através da violência e odiados por quase todos, os comunistas assumiram o poder. Isso não se deu sem a cooperação dos governantes america­nos e britânicos daqueles dias.
Os homens não são responsáveis perante Deus ape­nas por seus pecados pessoais, mas igualmente pelos seus pecados cometidos no plano nacional. A tragédia de to­das essas nações cativas é uma responsabilidade dos co­rações de crentes americanos e britânicos. Os america­nos devem saber que têm ajudado, involuntariamente, os russos a estabelecer sobre nós um regime de assassínio e terror. Devem expiar sua falta, agora, ajudando os povos cativos a vir à luz de Cristo.

São a mesma, a linguagem do Amor e a da Sedução

Desde que os comunistas assumiram o poder, cui­dadosa e astutamente para os seus propósitos têm se­duzido a Igreja. A linguagem do amor e a da sedução não diferem. Quem deseja uma jovem para ser sua es­posa e quem a deseja por apenas uma noite, para depois a desprezar, ambos dizem "eu te amo". Jesus ensinou-nos a distinguir a linguagem da sedução da do amor, bem como a distinguir entre os lobos vestidos de ove­lhas e as ovelhas de verdade.
Quando os comunistas assumiram o poder, milhares de padres, pastores e ministros não sabiam como dis­tinguir as duas vozes.
Os comunistas organizaram um Congresso de todos os grupos cristãos no edifício do nosso Parlamento. Ali estavam quatro mil padres, pastores e ministros de todas as denominações. Esses quatro mil padres e pas­tores escolheram Joseph Stalin como presidente hono­rário do Congresso. Ao mesmo tempo era presidente do Movimento Mundial dos Ateus e assassinos dos cristãos. Um após outro, bispos e pastores se levantou no nosso Parlamento e declararam que Comunismo e Cristianis­mo são fundamentalmente a mesma coisa e podiam muito bem coexistir. Um após outro, os ministros ali presentes pronunciaram palavras laudatórias ao Comu­nismo e asseguraram ao novo governo a lealdade da Igreja.
Minha esposa e eu estávamos presentes. Ela, sen­tada junto a mim, dizia-me: "Ricardo, levanta-te e lava esta vergonha que estão atirando à face de Cristo! Eles estão cuspindo no Seu rosto". Respondi-lhe: "Se eu assim proceder, você perderá seu marido". Ela atalhou: "Não quero ter um marido covarde".
Então me levantei e falei ao Congresso, exaltando não aos matadores de cristãos, mas a Cristo e Deus, e afirmei que nossa lealdade é devida em primeiro lugar ao Senhor. Os discursos nesse Congresso estavam sendo irradiados; por todo o país se ouvia a proclamação do Evangelho, feita da tribuna do Parlamento comunista! Depois tive de pagar por isto, mas valeu a pena!
Ortodoxos e protestantes disputavam entre si a en­trega de cada um ao Comunismo. Um bispo ortodoxo colocou em sua batina a foice e o martelo, pedindo aos seus subalternos que não mais o chamassem de "Sua Graça", mas de "Camarada Bispo". Assisti ao Congres­so dos batistas na cidade de Resita — congresso sob a bandeira vermelha — que o hino da União Soviética foi entoado por todos os presentes de pé. O presidente dos batistas afirmou que Stalin o que fez foi realizar a vontade de Deus e também o elogiou como um grande professor de Bíblia! Padres ortodoxos como Patrascoiu e Rosianou foram mais específicos. Tornaram-se agentes da Policia Secreta. Rapp, bispo representante da Igreja Luterana da Romênia, começou a ensinar no Seminá­rio Teológico que Deus deu três revelações: uma por Moisés, outra através de Jesus e a terceira através de Stalin, esta última superando a anterior.
Deve ficar entendido que os verdadeiros batistas, aos quais muito amo, não concordaram com isso e perma­neceram fiéis a Cristo, pelo que muito sofreram. En­tretanto, os comunistas "elegeram" seus líderes e eles não tiveram outra alternativa senão aceitá-los. A mes­ma situação continua hoje com a mais alta liderança religiosa.
Aqueles que se tornaram servos do Comunismo, em lugar de servos de Cristo, começaram a denunciar os irmãos que os não acompanhavam.
Da mesma forma como os cristãos russos criaram uma Igreja Subterrânea depois da Revolução no seu país, a ascensão do Comunismo e a traição praticada por muitos líderes oficiais da igreja compeliram-nos a criar também na Romênia uma Igreja Subterrânea, que fosse fiel à evangelização, à pregação do Evangelho e que atraísse as crianças para Cristo. Os comunistas proi­biram tudo isso e a igreja oficial concordou.
Juntamente com outros, comecei um trabalho sub­terrâneo. Fora, eu tinha uma posição social muito res­peitável, que nada tinha a ver com o meu trabalho se­creto e que servia apenas de cobertura. Era pastor da Missão Luterana Norueguesa e ao mesmo tempo traba­lhava na representação do Concilio Mundial de Igrejas na Romênia. (Na Romênia não tínhamos a menor idéia de que esta organização cooperasse com os comunistas. Naquela época em nosso país o Concilio Mundial não fazia coisa alguma a não ser o trabalho de assistência social). Estes dois títulos davam-me boa posição perante as au­toridades que não sabiam de minhas atividades secretas.
Elas tinham dois ramos.
O primeiro era nosso trabalho secreto entre um mi­lhão de soldados russos.
O segundo era o nosso ministério secreto entre o povo escravizado da Romênia.
Russos — um Povo de Alma Sedenta
Pregar o Evangelho aos russos é o mesmo que ex­perimentar o céu na terra. Já preguei a homens de muitas nações, porém nunca vi gente para absorver o Evangelho como os russos. Eles de fato têm almas se­dentas.
Um padre da Igreja Ortodoxa, muito amigo meu, telefonou-me e contou-me que um oficial russo o havia procurado para se confessar. Meu amigo, porém, não conhecia a língua russa. Sabendo que eu falava esse idioma, deu meu endereço ao oficial. No dia seguinte, ele veio ao meu encontro. Amava a Deus e O buscava, mas nunca havia visto uma Bíblia. Nunca assistira a trabalhos religiosos.    (Igrejas na Rússia são muito raras).   Não tivera nenhuma educação religiosa, porém amava a Deus sem ter o menor conhecimento dEle.
Comecei a ler para ele o Sermão da Montanha e as parábolas de Jesus. Depois de ouvi-las dançou ao redor da sala com grande alegria, exclamando: "Que beleza maravilhosa! Como é que eu poderia viver sem conhecer este Cristo!" Foi a primeira vez que vi uma pessoa tão arrebatada de alegria no Senhor.
Prosseguindo, cometi um erro. Li para ele a narra­tiva da Paixão e da Crucificação de Jesus, sem tê-lo ainda preparado para tanto. Ele não esperava, e quando ouviu do sofrimento de Cristo, como foi crucificado e finalmente morreu, caiu em uma poltrona e começou a chorar amargamente. Havia crido em um Salvador e agora este estava morto.
Olhei para aquele homem e fiquei envergonhado por me haver chamado de Crente e Pastor, mestre do rebanho e nunca haver partilhado dos sofrimentos de Cristo, como este oficial russo agora fazia. Ao vê-lo, senti como se estivesse a ver Maria Madalena chorando ao pé da cruz, e mesmo quando Cristo já era cadáver no túmulo.
Então li a história da Ressurreição. Ele não sabia que Cristo havia ressuscitado dos mortos. Quando ou­viu tão maravilhosas novas, bateu em seus joelhos e proferiu palavras não muito dignas, porém, eu as con­siderei de grande valor, pois esta era a sua rude ma­neira de se expressar! Mais uma vez se alegrou. Gritou de alegria: "Ele está vivo!". Novamente dançou ao re­dor da sala, transbordante de alegria.
Disse-lhe: "Oremos!" Ele não sabia como orar. Não sabia as nossas frases sagradas. Ajoelhamo-nos e suas palavras foram: "Oh Deus, que camaradão Tu és! Se eu fora Tu e Tu fosses eu, nunca Te perdoaria os Teus pecados. Porém Tu és realmente um camaradão! Eu Te amo de todo o meu coração".
Penso que todos os anjos nos céus pararam para ouvir esta sublime oração de um oficial russo. O ho­mem havia sido vencido por Cristo!
Certa vez encontrei em uma loja um capitão russo com uma senhora, também oficial. Estavam comprando multas coisas e tinham dificuldade em falar com o vendedor que não entendia russo. Ofereci-me como in­térprete e fizemos amizade. Convidei-os para almoçar em nossa casa. Antes de começarmos a refeição, eu lhes disse: "Vocês estão em uma casa cristã e aqui temos o hábito de orar". Orei em russo. Com surpresa para mim largaram os garfos e facas e não se inte­ressaram mais pela comida. Começaram a fazer-nos pergunta após pergunta a respeito de Deus, de Jesus Cristo e da Bíblia.   Não sabia de coisa alguma.
Não foi fácil falar-lhes. Contei-lhes a parábola do homem que tinha cem ovelhas e perdeu uma. Não en­tenderam. Perguntaram: "Como é que ele tem cem ovelhas? Porventura a fazenda comunista ainda não as tomou?" Afirmei-lhes que Jesus é um Rei. Responderam-me: "Todos os reis foram homens ruins que tiranizaram o povo e Jesus também deve ter sido um tirano". Quando lhes contei a parábola dos trabalhadores na vinha, disseram: "Bem, estes fizeram muito bem em se rebelar contra o dono. A vinha tem de pertencer à coletividade". Tudo lhes era novo. Quando lhes contei a respeito do nascimento de Jesus, perguntaram-me: O que na boca de um ocidental seria uma blasfêmia: "Era Maria a esposa de Deus?" E assim entendi pela conversa com eles e muitos outros que para pregar o Evangelho aos russos, depois de tantos anos sob o Co­munismo, devemos usar uma linguagem totalmente nova.
Missionários que foram à África, tiveram dificulda­des em traduzir as palavras de Isaías, "Ainda que os teus pecados sejam vermelhos como a escarlata eles se tornarão mais alvos que a neve." Ninguém na África Central jamais viu neve. Não tinham palavra para neve. Tiveram que traduzir: "Vossos pecados se tornarão mais alvos que a polpa de coco seco".
Dessa forma tínhamos que traduzir o Evangelho para a linguagem marxista, para torná-lo compreen­sível a eles.    Isso era algo que não podíamos fazer sozinhos, mas o Espírito Santo fez Seu trabalho por nosso intermédio.
O capitão e a oficial se converteram no mesmo dia. Depois nos ajudaram muito em nosso ministério subter­râneo entre os russos.
Secretamente imprimíamos milhares de Evangelhos e outros tipos de literatura cristã e distribuíamos entre os russos. Através dos soldados russos convertidos podía­mos contrabandear para a Rússia, muitas Bíblias e por­ções bíblicas.
Outra técnica também empregávamos para fazer chegar tal literatura às mãos dos russos. Os soldados russos estavam lutando havia vários anos e muitos deles tinham deixado crianças, às quais não viam por todo esse tempo. (Os russos têm grande afeição por crian­ças). Meu filho Mihai, juntamente com outras crianças de menos de dez anos, ia aos soldados russos nas ruas e parques, levando consigo muitas Bíblias, Evangelhos e panfletos religiosos em seus bolsos. Os soldados russos acariciavam-lhes as cabeças e com eles falavam carinhosamente, pensando em seus filhos que não viam por tantos anos. Davam chocolates ou doces e as crianças, por sua vez, davam-lhes alguma coisa: Bíblias e Evan­gelhos que eram recebidos com ansiedade. De fato, o que nos era muito perigoso fazer abertamente, nossos filhos faziam em completa segurança. Eles eram "pe­quenos missionários" a serviço dos russos. Os resulta­dos eram excelentes. Muitos soldados receberam o Evan­gelho dessa maneira, quando não existia outro meio para fazê-lo.


Pesquisa: Pastor Charles Maciel Vieira

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