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sexta-feira, 20 de maio de 2011

TORTURADO POR AMOR A CRISTO - 4ªParte-RICHARD WURMBRAND


Vários crentes me perguntaram como pudemos re­sistir à lavagem cerebral. Há apenas um método de resistência a ela. É a "lavagem do coração" Se o cora­ção estiver purificado pelo amor de Jesus Cristo e se O ama, pode-se resistir a toda e qualquer tortura. Que não faria uma noiva por seu noivo? Que não faria uma mãe por seu filho? Se você ama a Cristo, como Maria O amava, ela que o teve como criança em seus braços; se você, leitor, ama a Jesus, como uma noiva ao seu noivo, pode resistir a tais tormentos.
Deus nos julgará não de acordo com quanto pu­demos suportar, mas de acordo com quanto pudemos amar. Sou testemunha dos crentes em prisões comu­nistas, de que eles puderam amar. Puderam amar a Deus e aos homens.
Os suplícios e brutalidades continuavam sem inter­rupção. Quando eu perdia os sentidos, ou ficava tão entorpecido para dar aos torturadores qualquer espe­rança de confissão, era conduzido à minha cela. Ali era atirado sem nenhuma consideração e quase morto para me reanimar um pouco, a fim de que pudessem voltar a trabalhar em mim. Muitos morreram nesse ponto, mas de alguma maneira minhas forças voltavam. Nos anos seguintes, em várias prisões, quebraram-me quatro vértebras e muitos outros ossos. Golpearam-me em uma dúzia de lugares. Recebi queimaduras no corpo e dezoito ferimentos penetrantes.


Médicos em Oslo, Noruega, vendo tudo isto e as cicatrizes da tuberculose, que também tive, declararam que o fato de estar vivo hoje é um puro milagre. Se­gundo seus livros de Medicina, deveria eu estar morto há anos. Eu próprio reconheço ser um milagre. Deus é um Deus de milagres.
Creio que Deus operou esta maravilha para que muitos pudessem ouvir a minha voz bradar em favor da Igreja Subterrânea de trás da Cortina de Ferro. Permitiu que eu saísse vivo para fazer soar bem alto a mensagem do sofrimento de vocês, fiéis irmãos.
Breve período de liberdade — depois nova prisão
O ano de 1956 chegou. Havia estado na prisão por oito anos e meio. Perdera muito peso, adquirira "horrí­veis'' cicatrizes, fora brutalmente espancado, recebera pontapés, fora ridicularizado, passara fome, fora pres­sionado e interrogado 'ad nauseam", ameaçado e posto de lado. Nada disso havia dado o resultado que meus capturadores desejavam.    E, assim, desencorajados, soltaram-me. Além disso, estavam recebendo protestos por me haverem prendido.
Foi-me permitido voltar à minha posição anterior por apenas uma semana. Preguei dois sermões. Chama­ram-me e disseram-me que não poderia continuar pre­gando, nem participar de nenhuma atividade religiosa. Que havia eu dito? Aconselhei meus paroquianos a ter "paciência, paciência e mais paciência". "Isto significa que você está dizendo a eles que tenham paciência e os americanos virão e os livrarão" — era o que a polícia gritava para mim. Também eu havia dito que "o mundo dá muitas voltas e os tempos mudam". "Você está que­rendo dizer que os comunistas não vão continuar a do­minar! São mentiras contra-revolucionárias!" — ber­ravam eles. Assim foi que chegou ao fim meu minis­tério público.
Provavelmente as autoridades criam que eu esti­vesse com medo de desafiá-las e de voltar ao evangelismo subterrâneo. Nisso é que estavam enganadas. Se­cretamente voltei ao trabalho que fazia antes. Minha família sustentou-me moralmente.
Outra vez testemunhávamos a grupos escondidos, indo e voltando como uma assombração, sob a proteção daqueles em quem se podia confiar. Desta vez eu tinha as cicatrizes em que apoiar minha mensagem a respeito do mal do ponto de vista atpístico e para encorajar al­guma alma hesitante a crer em Deus e a ser valente. Dirigi uma rede secreta de evangelistas, que se em­penhavam na divulgação do Evangelho sob os olhos providencialmente cegos dos comunistas. Afinal, se al­guém pode ser tão cego ao ponto de não ver a mão de Deus a agir, poderá também não ver um evangelista em ação.
Finalmente o interesse incessante da polícia em minhas atividades e em saber por onde eu andava findou. Fui descoberto outra vez e novamente preso. Por alguma razão, desta vez não prenderam minha família, talvez por causa da publicidade feita a meu respeito.   Tivera oito anos e meio de prisão e três anos de liberdade relativa.   Agora ia ser preso por mais cinco anos e meio.
Minha segunda prisão foi, sob muitos aspectos, pior que a primeira. Sabia perfeitamente o que estava para vir. Minha condição física tornou-se péssima quase que imediatamente. Mas continuávamos o trabalho subter­râneo da Igreja Subterrânea nas prisões subterrâneas comunistas.
Fizemos um acordo — Nós pregávamos eles nos batiam!
Proibiram-me terminantemente de pregar a outros prisioneiros. Ficou entendido que quem fosse apanhado pregando, receberia uma tremenda surra. Vários de nós resolvemos pagar o preço do privilégio de pregar; por­tanto, aceitamos as condições deles. Era um acordo: nós pregávamos e eles nos batiam. Éramos felizes pre­gando. Estavam felizes em nos espancar. Por conse­guinte, todos estavam felizes.
A cena que vou descrever repetiu-se mais vezes de quantas me é possível lembrar: um irmão estava pre­gando a outros presos quando os guardas repentinamente entraram, surpreendendo-o na metade de uma frase. Arrastaram-no pelo corredor até a "sala de surras". Depois do que parecia uma surra que não acabava mais, traziam-no de volta e o jogavam — moído e sangrento — no chão do cárcere. Vagarosamente se reanimava. Doloridamente ajeitava a roupa e dizia: "Agora, irmãos, em que ponto estava quando fui interrompido?" E continuava a sua mensagem do Evangelho.
Já presenciei coisas belas assim!
Algumas vezes os pregadores eram leigos. Homens simples, inspirados pelo Espírito Santo, muitas vezes pregavam maravilhosamente. Punham todo o seu cora­ção no que diziam, pois, pregar sob tais circunstâncias de castigo não era coisa fácil. Os guardas vinham, le­vavam o pregador e o esbordoavam até quase morrer.
Na prisão de Gherla, um crente de nome Grecu foi sentenciado a apanhar até morrer. Nisso tiveram de gastar algumas semanas. Ia sendo espancado vagaro­samente. Uma vez na sola dos pés com um cassetete de borracha e deixado para um lado. Depois de alguns mi­nutos, outro golpe, alguns minutos mais, ainda outro. Levou pancada nos testículos. Veio o médico aplicar-lhe uma injeção. Recuperou os sentidos e lhe deram boa ali­mentação para recobrar as forças e então foi espan­cado outra vez até morrer sob essa pancadaria vagarosa e repetida. Um dos que presidiu a esse suplício cha­mava-se Reck, membro do Comitê Central do Partido Comunista.
Em dado momento esse Reck disse uma frase que os comunistas costumavam dizer aos crentes: "Sabe, eu sou Deus. Tenho poder de vida e morte sobre você. O que está no céu não pode resolver conservá-lo com vida. Tudo depende de mim. Se eu quiser você viverá se não quiser você morrerá. Eu sou Deus!" Dessa forma zombavam dos cristãos.
O irmão Grecu, nessa horrível situação, respondeu a Reck de um modo mui interessante, e que ouvi poste­riormente do próprio algoz: "Não sabes quão profun­das palavras disseste. És realmente Deus. Cada lagarta é na realidade uma borboleta, se desenvolver devi­damente. Não foste criado para ser torturador, para matar. Foste criado para te tomares um ser à seme­lhança de Deus. Jesus disse aos judeus dos Seus dias: 'Sois deuses'. A vida de Deus Pai está no teu coração. Muitos que foram como tu és, muitos perseguidores, como o apóstolo Paulo, descobriram em dado momento que é vergonhoso para o homem cometer tais atrocida­des, quando podem fazer coisas muito melhores. E tornaram-se participantes da natureza divina. Crê-me, Sr. Reck, sua verdadeira missão é ser deus, semelhante a Deus, e não um torturador".
Naquele momento Reck não prestou muita atenção às palavras de sua vitima, como Saulo de Tarso não ligou importância às belas palavras do testemunho de Estevão ao ser morto em sua presença.    Mas aquelas palavras trabalharam em seu coração.    Posteriormente entendeu ser realmente aquela a sua vocação.
Grande lição aprendemos com as surras, torturas e outros maus tratos dos comunistas: que o espírito é se­nhor, dominador do corpo. Muitas vezes, quando ator­mentados, sentíamos os tormentos, mas nos pareciam algo distantes e afastados do espírito que estava embe­vecido na Glória de Cristo e com Sua presença em nós.
Quando nos era dada uma fatia de pão por sema­na e uma sopa nojenta por dia, resolvemos que até em tais circunstâncias daríamos fielmente o "dízimo". Cada décima semana tomávamos a fatia de pão e a dávamos a um irmão mais fraco, como nosso "dízimo" ao Senhor.
Um crente fora sentenciado à morte. Antes de ser executado foi-lhe permitido ver a esposa. Suas últimas palavras a ela foram: "Deves saber que morrerei aman­do aqueles que me matam. Não sabem o que fazem e meu último pedido a você é que os ame também. Não tenha ódio no coração por matarem seu amado. Nós nos •encontraremos nos céus". Estas palavras impressiona­ram o oficial da Polícia Secreta que estava presente à conversa entre os dois, o qual me contou a história na prisão, onde havia sido colocado por se haver tornado crente.
Na prisão de Tírgu-Ocna havia um jovem prisio­neiro por nome Matchevici. Havia sido posto na prisão com a idade de dezoito anos. Por causa das torturas estava muito doente, tuberculoso. A família de alguma maneira o descobriu e lhe enviou um pacote com 100 tubos de Streptomicina, que poderiam restaurar-lhe a saúde. O oficial político da prisão chamou-o e mostrou-lhe o pacote, dizendo: "Aqui está o medicamento que pode salvá-lo. Mas não lhe é permitido receber pacotes de seus familiares. Pessoalmente eu gostaria de aju­dá-lo. Você é jovem. Não gostaria de vê-lo morrer na prisão. Ajude-me a poder prestar-lhe assistência. Dê-me informações de seus companheiros de prisão e isto me justificará ante meus superiores por lhe haver entregue o pacote".    Matchevici respondeu prontamente:     "Não desejo permanecer vivo e me envergonhar de olhar-me num espelho, porque verei o rosto de um traidor. Não posso aceitar tal condição. Prefiro morrer". O ofi­cial da Polícia Secreta balançou a cabeça e disse: "Con­gratulo-me com você. Não esperava outra resposta sua. Gostaria, porém de lhe fazer outra proposta. Alguns dos presos tornaram-se nossos informantes. Afirmam ser comunistas e estão denunciando você. Fazem um jogo duplo. Não temos confiança neles. Gostaríamos de saber até que ponto são sinceros. São seus traidores. Estão-lhe fazendo muito mal aos nos informarem de suas pa­lavras e ações. Entendo que você não queira trair seus amigos. Então dê-nos informações destes que se opõem a você, de maneira que possa salvar a sua vida!" Mat-chevici respondeu tão prontamente quanto da primeira vez: "Sou discípulo de Cristo. Ele nos ensinou que de­vemos amar até aos nossos inimigos. Estes que nos traem fazem-nos muito mal, porém não posso retribuir mal por mal. Não posso dar informação nem mesmo contra estes. Tenho piedade deles, oro por eles e não desejo ter qualquer ligação com os comunistas". Matchevicl voltou da entrevista com o oficial político e morreu na mesma cela em que eu estava. Vi-o morrendo — a louvar a Deus. O amor venceu até a sede natural pela vida!
Se uma pessoa muito pobre ama realmente a mú­sica, dá seu último centavo para ouvir um concerto. Depois vai ficar sem nada, mas não se sentirá frustrada. Ouviu músicas belíssimas.
Não me sinto frustrado por haver perdido tantos anos na prisão. Vi coisas belíssimas. Eu mesmo já estive preso no meio de pessoas fracas e sem Importância, porém tive por outro lado o privilégio de estar na mesma cela com grandes santos, heróis da fé, que se iguala­vam aos cristãos do primeiro século. Alegremente mar­chavam para morrer por Cristo. A beleza espiritual de tais santos e heróis da fé jamais será possível descrever.
As coisas que relato aqui não são excepcionais. O sobrenatural tornou-se natural para os crentes da Igreja Subterrânea.
A Igreja Subterrânea é a Igreja que voltou ao pri­meiro amor.
Antes de entrar na prisão eu amava muito a Cristo. Agora, depois de ter visto a "noiva do Senhor" — seu Corpo espiritual — no cárcere, quero afirmar que amo a Igreja Subterrânea tanto quanto amo ao próprio Cristo. Vi a beleza dela e seu espírito de sacrifício.

O que aconteceu à minha esposa e ao meu filho

Fui levado para longe de minha esposa. Não sabia o que lhe havia acontecido. Depois vim a saber que também havia sido aprisionada. As mulheres crentes sofrem muito mais que os homens, na prisão. As moças são violentadas pelos guardas brutais. A blasfêmia e as obscenidades são horrveis. As mulheres eram obriga­das a trabalho forçado em um canal que tinha de ser construído, e tinham de executar a mesma tarefa que os homens. Removiam terra no inverno. Prostitutas eram colocadas como supervisoras e rivalizavam com os guar­das nas torturas aos fiéis. Minha esposa teve que comer grama feito gado para poder sobreviver. Ratos e cobras eram comidos pelos prisioneiros famintos nesse canal para não morrerem de fome. Uma das diversões dos guardas aos domingos era empurrar mulheres para dentro do Danúbio e depois pescá-las, para se rirem e ridicularizá-las quando viam seus corpos molhados e jogá-las de volta ao rio para serem pescadas outra vez. Minha esposa foi atirada ao Danúbio dessa maneira.
Meu filho fora deixado em liberdade para vagar pelas ruas, quando a mãe e eu estávamos presos. Mihai tinha sido desde criança muito religioso e muito interessado em assuntos relacionados com a fé. Depois, com a idade de 9 anos, quando eu e a mãe fomos arrebatados dele, passou por uma crise em sua fé cristã. Havia-se tornado ríspido e duvidava de toda a sua religião. Tinha com essa tenra idade problemas que as crianças em geral não têm.    Precisava pensar em ganhar o pão de cada dia.
Era crime ajudar as famílias dos mártires cristãos. Duas senhoras que ajudaram meu filho foram presas e apanharam tanto que até o presente estão aleijadas, depois de 15 anos. Uma senhora, que arriscou a vida e levou-o para sua casa, foi condenada a oito anos de prisão por esse crime de ter ajudado a família de um preso. Todos os seus dentes lhe foram quebrados a pon­tapés. Seus ossos fraturados. Nunca mais poderá tra­balhar.  Ela também ficará aleijada para o resto da vida.
"Mihai, creia em Jesus!"
Com a idade de 11 anos, Mihai começou a ganhar sua manutenção, trabalhando habitualmente. Os sofri­mentos abalaram sua fé. Mas depois de dois anos de encarceramento de minha esposa, foi-lhe permitido visitá-la. Dirigiu-se à prisão comunista e viu sua mãe por trás das grades de ferro. Estava suja, magra, com as mãos calejadas, vestindo esfarrapado uniforme de prisão. Mal a reconheceu. As primeiras palavras dela foram: "Mihai, creia em Jesus!" Os guardas, com fúria selva­gem, tiraram-na da presença de Mihai e a levaram. O menino chorou ao ver sua mãe ser arrastada. Esse minuto foi o momento de sua conversão. Ele sabia que se Cristo pode ser amado sob tais circunstâncias, é real­mente o verdadeiro Salvador. Posteriormente afirmou: "Se o Cristianismo não tivesse outro qualquer argu­mento em seu favor, além do fato de minha mãe crer nele, este mesmo fato seria para mim suficiente". Aquele foi o dia em que aceitou a Cristo completamente.
Na escola, Mihai tinha uma batalha contínua pela sua existência. Fora bom aluno e como recompensa recebera uma gravata vermelha — sinal de membro dos Jovens Pioneiros Comunistas. Meu filho disse: "Jamais usarei a gravata daqueles que aprisionaram meu pai e minha mãe". Foi expulso da escola por isto. Depois de perder um ano, entrou na escola outra vez, escondendo o fato de ser filho de um preso cristão.
Posteriormente teve de escrever uma tese contra a Bíblia.   E escreveu: "Os argumentos contra a Bíblia são fracos e as citações contra ela são inverídicas. Certa­mente o professor jamais leu a Bíblia. A Bíblia está em harmonia com a ciência". Outra vez foi expulso. Agora teve de perder dois anos escolares.


Por fim permitiram-lhe entrar no Seminário. Aí lhe era ensinada "Teologia Marxista". Tudo era expli­cado de acordo com os padrões de Karl Marx. Mihai protestou publicamente em classe. Outros estudantes fizeram o mesmo. O resultado foi ser expulso e não pôde terminar seu treinamento teológico.
Certa vez na escola, quando o professor proferia uma conferência ateística, meu filho levantou-se e o contra­disse, afirmando que sobre ele pesava grande responsa­bilidade ao levar tantos jovens pelo caminho errado. Toda a classe ficou ao seu lado. Foi necessário que um tivesse a coragem de se levantar primeiro. Então todos ficaram de seu lado. Para obter a sua educação, cons­tantemente encobria o fato de ser filho de Wurmbrand, o prisioneiro cristão. Todavia com freqüência era des­coberto, repetindo-se a cena costumeira de ser chamado ao gabinete do diretor para ser expulso.
Mihai também passou muita fome. As famílias de cristãos encarcerados nos países comunistas quase sem­pre chegam perto de morrer de fome. Ê grande crime ajudá-las.
Contarei apenas um caso de sofrimento, de uma família que conheço pessoalmente. Um irmão fora preso por seu trabalho na Igreja Subterrânea. Deixara a esposa com seis filhos. As filhas mais velhas, de 17 e 19 anos, não podiam arranjar emprego. O único que prove trabalho num país comunista é o Estado, e não o dá a filhos dos crentes "criminosos". Por favor, os leitores não julguem esta história à luz de padrões mo­rais. Apenas recebam os fatos. As duas filhas do mártir cristão — também crentes — tornaram-se prostitutas para poder sustentar seus irmãos mais novos e a mãe doente. O irmão mais novo, de 14 anos, enlouqueceu quando viu o que estava acontecendo e teve de ser man­dado a um asilo.  Quando, depois de anos, o pai retornou, sua única oração era: "Deus, leva-me de volta à prisão. Não poderei suportar ver isto". Sua oração foi respon­dida e está agora na prisão, pelo crime de haver teste­munhado de Cristo às crianças. Suas filhas não são mais prostitutas. Receberam um trabalho da Polícia Secreta. Tornaram-se informantes. Como filhas de um mártir cristão, são recebidas com honra em todas as casas. Escutam e então relatam tudo quanto ouvem à Polícia Secreta.
O leitor não deve apenas dizer que é uma história fria e imoral. Certamente que é, mas pergunte a si mesmo se não é também seu, o pecado de tais tragédias ocorrerem — essas famílias cristãs serem deixadas aban­donadas, sem a sua ajuda, que é livre.


CAPÍTULO III

Passei um total de catorze anos na prisão. Durante todo este tempo não vi a Bíblia ou qualquer outro livro evangélico. Cheguei ao ponto de esquecer-me de escre­ver, e por causa de grande fome, entorpecentes que me aplicavam e torturas, esqueci-me também das Escrituras. Mas no dia em que havia completado catorze anos de encarceramento, lembrei-me do versículo: "Jacó trabalhou por Raquel catorze anos e isto lhe pareceu pouco tempo porque ele a amava.”.
Pouco depois, eu era posto em liberdade, em conse­qüência de uma anistia geral em todo o país, em grande parte por influência da opinião pública norte-americana.
Outra vez encontrei-me com minha esposa, que me havia esperado fielmente durante esses catorze anos.
Começamos uma vida nova, em extrema pobreza, porque se alguém é preso tudo que possui é confiscado.
Os padres ortodoxos e os pastores que foram liber­tados podiam ficar com pequenas igrejas. Foi-me en­tregue uma na cidade de Orsova. O Departamento de Cultos do Regime Comunista advertiu-me que a minha Congregação era composta de trinta e cinco membros e que esse número nunca poderia chegar a trinta e seis. Também me foi dito que teria de ser agente do Depar­tamento e relatar à Polícia Secreta a respeito de todos os membros e manter todos os jovens fora da Igreja. Este é o meio pelo quais as Igrejas são usadas como "instrumento" de controle dos comunistas.
Sabia que, se começasse a pregar, muitos haveriam de vir ouvir, portanto nunca tentei principiar meu tra­balho na Igreja Oficial. Trabalhei outra vez na Igreja Subterrânea, partilhando de todos os perigos e glórias desse trabalho.
Durante os anos que passei na prisão Deus operou maravilhas.  A Igreja Subterrânea não estava mais abandonada e esquecida.    Crentes americanos e outros ha­viam começado a nos ajudar e a orar por nós.
Uma tarde quando descansava um pouco em casa de um amigo crente em uma cidade provinciana, este me acordou e disse: "Chegaram alguns irmãos de longe". No Ocidente havia crentes que não nos haviam esque­cido ou abandonado.
Alguns crentes (não Incluindo pastores ou líderes) haviam organizado um serviço Secreto de ajuda às fa­mílias dos mártires cristãos, como também de contra­bando de literatura evangélica e de socorro.
Na outra sala encontrei seis irmãos que haviam vindo para fazer este trabalho. Falaram muito comigo. Depois de multo tempo disseram que tinham ouvido que naquele endereço havia um homem que passara catorze anos na prisão, ao qual gostariam de conhecer. Então lhes disse que eu era o homem a quem procuravam. Disse­ram: "Esperávamos ver uma pessoa melancólica. Você não pode ser a pessoa que buscamos porque é cheio de alegria". Assegurei-lhes ser o homem a quem busca­vam e disse-lhes que a alegria que viam em mim era por saber que haviam vindo e que não estávamos mais esquecidos. Uma ajuda certa e contínua começou a vir para a Igreja Subterrânea. Por canais secretos conse­guimos muitas Bíblias e literatura evangélica em geral, como também ajuda material para as famílias dos már­tires cristãos. Agora com a ajuda destes, nós, da Igreja Subterrânea, podíamos fazer um trabalho bem melhor.
Não era apenas o fato de nos trazerem a Palavra de Deus, mas também o de sabermos que éramos amados. Eles nos trouxeram uma palavra de conforto.
Durante os anos de lavagem cerebral ouvíamos com muita freqüência: "Ninguém mais os ama, ninguém mais os ama, ninguém mais os ama". Agora víamos crentes, tanto americanos como ingleses que arriscavam a vida para mostrar que nos amavam. Aceitando nossos conselhos, desenvolveram técnicas do Serviço Secreto. Penetravam em casas já cercadas pela Polícia “Secreta” A Polícia não sabia que haviam entrado.
O valor dessas Bíblias contrabandeadas por tais homens jamais pode ser entendido por pessoas livres, americanos ou ingleses, que "nadam" em Bíblias!
Minha família e eu não teríamos sobrevivido não fora a ajuda recebida dos crentes que oravam por nós. O mesmo acontece com muitos pastores ou famílias de mártires da Igreja Subterrânea nos países comunistas. Posso dar testemunho de minha própria experiência a respeito da ajuda material e, mais ainda, da ajuda mo­ral que nos foi dada pela Missão Cristã Européia da In­glaterra. Para nós, seus homens foram como que anjos enviados por Deus!
Por causa do desenvolvimento do trabalho da Igreja Subterrânea, estive mais uma vez na iminência de ser preso. Então, desta vez duas organizações — A Missão Norueguesa para os Judeus e a Aliança Cristã Hebraica — pagaram um resgate de 2.500 libras por minha pessoa. Podia agora deixar a Romênia.

Por que deixei a Romênia Comunista

Não a teria deixado — apesar dos perigos — se os líderes da Igreja Subterrânea não me tivessem cons­trangido a usar esta oportunidade de deixar o país, para ser a "voz" da Igreja Subterrânea para o mundo livre. Eles desejavam que eu falasse em seu nome, a vocês, do mundo ocidental a respeito de seus sofrimen­tos e necessidades. Vim para o Ocidente; meu coração, porém, ficou com eles. Se não entendesse que havia grande necessidade de vocês ouvirem a respeito dos so­frimentos e do trabalho corajoso da Igreja Secreta, jamais teria deixado a Romênia. Esta é, portanto, a mi­nha missão.
Antes de deixar meu país fui chamado duas vezes ã Policia Secreta. Disseram-me que haviam recebido o dinheiro do meu resgate. (A Romênia vende seus ci­dadãos a dinheiro, por causa da difícil crise financeira trazida para o nosso país pelo Comunismo).   Disseram-me: "Vá para o Ocidente e pregue Cristo tanto quanto queira, mas não nos moleste. Não diga nada contra nós. Aqui está o nosso plano a seu respeito, se contar o que lhe aconteceu durante estes anos: Em primeiro lugar, por apenas 500 libras podemos contratar Um 'gangster' para liquidá-lo, ou poderemos raptá-lo". (Estive na mesma cela com um bispo ortodoxo, Vasile Leul, que fora raptado na Áustria e trazido para a Romênia. To­das as suas unhas lhe haviam sido arrancadas. Estive também com outros raptados em Berlim. Recentemen­te romenos foram raptados em Paris e na Itália). Dis­seram-me mais: "Podemos também destruí-lo moral­mente, espalhando uma estória sua com uma jovem, roubo ou algum outro pecado de sua juventude. Os ocidentais — especialmente os americanos — deixam-se enganar facilmente".
Depois de me haverem ameaçado, permitiram-me vir para o Ocidente. Têm muita confiança no processo da lavagem cerebral pelo qual passei. No Ocidente exis­tem muitos que, como eu, passaram por lavagem cere­bral, os quais foram reduzidos ao silencio. Alguns deles até mesmo louvam o Comunismo depois das torturas por que passaram. Os comunistas estavam bem seguros de que eu também guardaria silencio.
Assim, em dezembro de 1965, eu e minha família deixamos a Romênia.
Meu último ato, antes de partir, foi visitar o túmulo do coronel que me mandou prender e decretou os meus anos de prisão. Coloquei uma flor sobre o seu túmulo. Fazendo isso, dediquei-me a trazer as alegrias de Cristo, que tenho, para os comunistas, que são tão vazios espi­ritualmente.
Odeio o sistema comunista, mas amo os seus homens. Odeio o pecado, mas amo o pecador. Amo os comunis­tas de todo o meu coração. Eles podem matar os crentes, mas o amor que estes têm por aqueles que os matam, esse amor eles não destroem. Não tenho o menor rancor aos comunistas, nem mesmo aos meus torturadores.



CAPITULO IV
Os judeus têm uma lenda interessante. Quando seus antepassados foram salvos do Egito e os egípcios se afo­garam no Mar Vermelho, os anjos, juntamente com eles, cantaram louvores. E Deus disse aos anjos: "Os judeus podem alegrar-se por serem homens e alegram-se por estar livres. Mas de vocês espero mais compreensão. Não sãos os egípcios também minhas criaturas? Não os amo também Eu? Como então vocês se negam a sentir como Eu o trágico destino deles?”.
"E estando Josué ao pé de Jerico, levantou os olhos e olhou; e eis que se pôs em pé diante dele um homem que tinha na mão uma espada desembainhada. Chegou-se Josué a ele e lhe disse: “És tu os nossos, ou dos nossos adversários”?”.
Se aquele que foi encontrado por Josué fosse ape­nas homem só poderia ter dito "sou por ti", ou "sou por teus inimigos", ou talvez "sou neutro". São estas as únicas respostas que uma criatura humana pode dar a tal pergunta. Entretanto o Ser com o qual Josué se encontrou era de outra esfera e, por isso, quando inda­gado se era pró ou contra Israel, respondeu: "Não". Que significava esse "Não"?
Ele proveio de outra esfera onde os seres não são pró nem contra, mas onde cada um e tudo é bem en­tendido, visto com piedade, compaixão e fervente amor.
Existe um nível humano. Nesse nível, *o Comunismo deve ser combatido de modo total. Nesse nível temos de lutar também contra os comunistas, em vista de patro­cinarem esse sistema seu, cruel e selvagem.
Os crentes, porém, são mais do que meros homens; são filhos de Deus, participantes da Natureza Divina.
Por conseguinte, as torturas sofridas nas prisões comunistas não me fizeram odiar os comunistas. Eles também são criaturas de Deus.   Como poderia odiá-los?
Também não posso ser amigo deles. Amizade significa duas almas interligadas. Eu não tenho minha alma in­terligada com a dos comunistas. Eles detestam a idéia de Deus.   Eu amo a Deus.
Se me fosse perguntado: "Você é pró ou contra os comunistas?" Minha resposta seria complexa. O Comu­nismo é o maior perigo para a humanidade. Sou dia­metralmente oposto a ele e desejo combatê-lo até vê-lo derrotado. Mas, no espírito, estou nos lugares celestiais com Cristo. Estou sentado na esfera do "Não", na qual, apesar de todos os crimes dos comunistas, estes são entendidos e amados; esfera na qual há seres angelicais tentando ajudar todos a atingir o alvo da vida huma­na, que é imitar Cristo. Portanto, meu objetivo é es­palhar o Evangelho entre os comunistas, dando-lhes as boas novas de Vida Eterna.
Cristo, que é meu Senhor, ama os comunistas. Ele próprio já afirmou que ama a todos os homens e que preferiria deixar noventa e nove ovelhas justas a permi­tir que uma única extraviada continuasse perdida. Seus Apóstolos e todos os grandes mestres do Cristianismo nos ensinam este amor universal em Seu nome. São Macário disse: "Se um homem ama a todos os demais com ardor, mas refere apenas um a quem não pode amar tal homem não é mais um cristão, porque seu amor não é universal". Santo Agostinho ensina: "Se toda a hu­manidade fora perfeita, mas apenas um homem fora pecador, Cristo teria vindo sofrer na cruz por esse ho­mem, porquanto Ele ama cada pessoa individualmente". Os ensinamentos cristãos são claros. Os comunistas são homens, e Cristo os ama. Da mesma maneira agem todos quantos têm a mente de Cristo. Amamos ao pecador, apesar de odiarmos o pecado.
Sabemos do amor de Cristo para com os comunis­tas por intermédio do nosso amor para com eles.
Já vi nas prisões comunistas crentes com 25 quilos de correntes presas aos seus pés, flagelados com ferro em brasa, na garganta dos quais, várias colheres de sal eram colocadas, sendo deixados depois sem água, com fome, recebendo chicotadas, tiritantes, a orar com fer­vor pelos comunistas. Era isto humanamente inexplicá­vel, senão que o amor de Cristo fora derramado naqueles corações.
Depois de algum tempo, os comunistas que nos ha­viam torturado eram presos por sua vez. Sob o Comu­nismo, comunistas e até seus líderes são metidos na ca­deia, quase que tão freqüentemente quanto seus adver­sários. Era agora a vez de os torturadores estarem na mesma cela dos torturados. E enquanto os reclusos não crentes mostravam ódio aos seus ex-torturadores e os maldiziam, os presos crentes tomavam a si a defesa deles, apesar de se arriscarem a ser espancados e acusa­dos de cumplicidade com eles. Já presenciei crentes dando sua última fatia de pão (tínhamos na ocasião uma por semana) e o medicamento que poderia salvar suas vidas, a um torturador comunista doente, que era agora um companheiro de cela!
As últimas palavras de Iuliu Maniu, ex-Primeiro Mi­nistro da Romênia, crente e que morreu na prisão, fo­ram: "Se os comunistas forem dominados em nosso país, a missão mais sagrada de cada crente será ir às ruas, arriscando sua própria vida, para defender os co­munistas da fúria daqueles que com razão os buscam por haverem sido tiranizados por eles".
Nos primeiros dias após minha conversão, sentia que viver não me era mais possível. Andando pelas ruas o coração se me confrangia, diante de cada homem ou mulher por quem passasse. Era-me como se um punhal ferisse meu coração, tão pungente para mim era a dúvida, se ele ou ela havia ou não sido salvo. Se um membro da Igreja pecava, eu passava horas a chorar. O desejo de que todas as almas se salvassem estava de contínuo em meu coração, e ainda hoje os comunistas não estão excluídos dele.
Em prisão solitária não podíamos orar como antes. Ficávamos inconcebivelmente famintos. Éramos narco-tizados até nos tornarmos como idiotas.    Éramos tão fracos como esqueletos. A oração do Pai Nosso era muito longa para que a pudéssemos recitar. Não podíamos nos concentrar o tempo bastante para isso. Minha única oração, que repetia sempre, era:     "Jesus, eu te amo!”.
Um dia glorioso, então, recebi a resposta de Jesus: "Tu me amas? Agora te mostrarei como Eu te amo". Imediatamente senti um calor no coração, como de raios solares. Os discípulos a caminho de Emaús disseram que seus corações ardiam enquanto Jesus lhes falava. O mesmo me aconteceu. Conheci o amor dAquele que Se deu na cruz por todos nós. Tal amor não pode excluir os comunistas, entretanto agrava mais os pecados deles.




Pesquisa: Pastor Charles Maciel Vieira

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