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sábado, 30 de abril de 2016

EVANGELHO DE COLISÃO - O DESERTO ENSINA...

O deserto ensina... que você tem de confiar... somente em Deus!!!
UMA MENSAGEM DE DEUS PARA VOCÊ
Evangelho de Colisão - Pastor Charles Maciel Vieira 


EVANGELHO DE COLISÃO - TÁ DOENDO MAS EU AGUENTO....

Tá doendo... mas eu aguento... Deus está comigo!!!
UMA MENSAGEM DE DEUS PARA VOCÊ
Evangelho de Colisão - Pastor Charles Maciel Vieira

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Os Evangelhos - Críticas e alternativas à teoria das duas fontes


Após a sua formulação por H. J. Holtzmann em 1863, a teoria das duas fontes alcançou uma predominância rara na história da exegese, pelo menos no campo protestante da interpretação dos evangelhos. Segundo R. Riesner, a igreja católica foi a que por mais tempo se opôs a essa teoria. Ainda em 1912 um decreto da comissão bíblica papal declarou que “a teoria não tinha o apoio do testemunho da tradição e nem de argumentos históricos”. Mesmo que oficialmente esse decreto não tenha sido revogado, após a segunda guerra mundial os estudiosos católicos do NT adotaram a teoria das duas fontes sem restrições.

R. Riesner diz:
Em 1960 parece ter vindo a vitória final. “O trabalho crítico sobre as fontes dos sinópticos chegou ao seu final com a teoria das duas fontes” anunciou P. Vielhauer. E na Einleitung in das Neue Testament (Introdução ao NT) de W. Marxsen lemos: “A expressão teoria das duas fontes se afirmou tão fortemente na pesquisa que somos tentados a abandonar o termo teoria (no sentido de hipótese). Pois, de fato, podemos considerá-la uma solução segura e definitiva… .” Todo estudante de teologia estuda essa conclusão como segura e definitiva no seminário. Questionamentos e discussões sobre alternativas são perda de tempo. Até o padre que prepara exegeticamente um texto sinóptico para a pregação conta com essa solução segura e definitiva.

Será que uma teoria que conquistou a confiança tão grande dos estudiosos pode ser questionada seriamente? R. Riesner admite que sim ao entrar na discussão das críticas que foram levantadas a partir da metade dos anos 60. Não é possível fazer o detalhamento dessas críticas aqui. Vamos apresentar apenas as linhas gerais dessa posição para podermos entender as críticas levantadas.

Pesquisas matemático-estatísticas feitas sobre o problema sinóptico levaram a conclusões que estão questionando a teoria das duas fontes como única solução possível para o problema. Os estudiosos B. de Solages e R. Morgenthaler provaram que é possível imaginar uma dinâmica de uso e dependência entre os sinópticos bastante variada. Disso faz parte a solução que coloca Marcos como o mais antigo, mas apenas como uma solução entre muitas outras. O matemático francês L. Frey examinou a seqüência das perícopes, das frases e das palavras dos evangelhos sinópticos com métodos de eficiência comprovada em outros campos da ciência e concluiu que não é possível demonstrar a dependência direta entre os sinópticos. Melhor seria explicar a semelhança entre os sinópticos pelo fato de terem se baseado em uma variedade de fontes pré-sinópticas (cf. Lc 1.1-4).

O argumento principal de Lachmann a favor de Marcos como o evangelho primitivo — o fato de que Mateus e Lucas concordam na seqüência das perícopes e da formulação das palavras naqueles textos em que são paralelos a Marcos — é discutido e questionado por vários estudiosos. Eles explicam esse fenômeno com outros aspectos da teoria da utilização:
R. Riesner cita ainda alguns critérios de pesquisa que podem ser aplicados à teoria de Marcos como o evangelho primitivo. Se for demonstrado que ela não pode ser sustentada, uma coluna da teoria das duas fontes cairia, e com isso a teoria toda. Os seguintes critérios entram em discussão:

A teoria de Marcos como mais antigo é questionável se:
- textos em Mateus e Lucas que diferem de Marcos não puderem ser explicados satisfatoriamente;
- no contraste com Marcos, Mateus e Lucas soarem muito semíticos na sua linguagem e mostrarem deteriorações no estilo;
- as diferenças de Mateus e Lucas com a versão de Marcos puderem ser entendidas como mais próximas da tradição oral;
- Marcos for menos judeu do que Mateus e Lucas;
- diferenças entre os sinópticos puderem ser explicadas como variantes de tradução do aramaico;
- Mateus e Lucas concordarem em oposição a Marcos (os chamados “minor agreements”, concordâncias menores).

Após aplicar esses critérios a diversos textos sinópticos, R. Riesner chega à seguinte conclusão: “A teoria das duas fontes tem a grande vantagem de simplificar consideravelmente o problema das fontes dos sinópticos e também de ser uma teoria facilmente aplicável. Talvez aqui esteja um grande motivo para a popularidade da teoria. … Na minha opinião, a teoria das duas fontes traz mais dúvidas do que respostas. Para maior clareza, deveríamos falar de uma hipótese das duas fontes. A procura por soluções que venham ao encontro da diversidade de questões apresentadas pelo problema sinóptico ainda não chegou ao fim.”

R. Riesner não é o único que tem essa visão crítica da teoria das duas fontes, o que fica evidente nas observações de K. Haacker:
A teoria das duas fontes convence pela sua simplicidade. Mas isso não é argumentohistórico, e sim um convite para o comodismo. Ninguém pode dizer a priori que os procedimentos na origem dos evangelhos devem ter sido simples, pois não conhecemos processos literários comparáveis sobre os quais tenhamos melhores informações. Ao contrário, Lucas diz na introdução do seu evangelho ter conhecido e usado mais do que duas fontes. O problema sinóptico é, portanto, parecido com uma equação de um número desconhecido de variáveis. Não é aconselhável inventar, a esmo, ferramentas hipotéticas de auxílio para a solução do problema. Também não deveríamos ignorar a possibilidade da existência de outras fontes desaparecidas.

Será que após essas observações o leitor dos evangelhos sinópticos terá de ficar sem respostas sobre a história da sua origem? Será que os elementos que temos no NT, unidos às informações que temos da igreja antiga, não podem nos conduzir a conclusões mais convincentes do que as apresentadas para a teoria das duas fontes? Talvez a hipótese dos fragmentos (diegesis) não deveria ter sido abandonada tão rapidamente. Seja como for, no final do século passado o estudioso do NT Frédéric Godet apresentou uma alternativa para a teoria das duas fontes que merece reflexão.

Em relação ao problema sinóptico ele se pronunciou no compêndio Bibelstudien (Hannover, 1878) e na sua Einleitung in das NT (Introdução ao NT). O comentário sobre Lucas também mostra a sua posição sobre o assunto.

Ponto de partida para as reflexões de Godet é o conteúdo dos sinópticos, que ele tenta aceitar sem opiniões pré-concebidas. Para interpretar e explicar esse conteúdo, Godet faz uso das informações sobre o ensino e a pregação da igreja primitiva em Atos. Em contraste com muitos outros autores, ele tem grande respeito também pelas informações da igreja dos primeiros séculos sobre a autoria dos três primeiros evangelhos. A posição de Godet em relação ao problema sinóptico é caracterizada pela grande confiança na confiabilidade da versão sinóptica e por uma desconfiança profunda nas reconstruções da teoria das duas fontes por causa das contradições não resolvidas associadas a ela.

Com base nisso, Godet chegou às seguintes conclusões:
Desde o início existiu uma tradição apostólica das palavras e dos atos de Jesus. O “ensino apostólico” citado em Atos 2.42 não era afirmação teológica sobre Jesus Cristo, tendo em vista a simplicidade dos apóstolos. Essa tarefa ficou reservada principalmente para Paulo. No início, é verdade, o ensino apostólico era predominantemente transmissão das palavras e atos de Jesus. Pois esse era o critério para a escolha de um apóstolo: ele deveria ser testemunha ocular dos fatos da vida de Jesus (At 1.21).

Com isso Godet acredita que, já no início da história do cristianismo, os relatos das testemunhas oculares da igreja primitiva se desenvolveram e foram colocados em forma escrita.

Pelo fato de se falar aramaico e grego na igreja primitiva (veja o conflito em At 6), era necessário que já no início os relatos das testemunhas oculares fossem traduzidos para o grego. Provavelmente existiu algo como a tradução grega autorizada da versão apostólica.

Godet reconhece em Mateus e Pedro os apóstolos transmissores dessa versão. Os pontos principais da versão formada por Pedro seriam os atos de Jesus na Galiléia e em Jerusalém. Com isso teria surgido a versão de Jerusalém na qual não só perícopes isoladas teriam se firmado, como também unidades de texto gregas mais extensas. Pedro teria transmitido essa forma básica da versão de Jerusalém nas suas viagens, e complementado com experiências pessoais da convivência com Jesus. 

Segundo as informações da igreja antiga, João Marcos o teria acompanhado nas viagens como intérprete. O evangelho de Marcos teria surgido com base nessas viagens e estaria baseado, por um lado, na tradição de Jerusalém, e por outro, nos acréscimos das experiências pessoais de Pedro. Godet, com isso, adota a informação transmitida por Papias sobre a origem do evangelho de Marcos.

A ênfase da versão transmitida por Mateus estaria nos ditos e discursos de Jesus (logia). Nesse sentido ele aceita a informação de Papias sobre Mateus. A forma básica dessa versão teria sido escrita em aramaico, pois essa era a língua que Jesus falava. Pelo fato de a igreja primitiva falar duas línguas, Mateus teria preparado uma tradução grega, que, segundo Godet, seria claramente perceptível nos discursos do evangelho de Mateus.

Essas versões dos apóstolos Mateus e Pedro teriam sido registradas por muitos em aramaico e em grego. Dessa forma também teriam surgido agrupamentos mais extensos de perícopes. Essas versões teriam formado a base da proclamação no cristianismo primitivo, como Lucas 1.1-4 claramente indica. Em outras palavras: no princípio da Igreja de Jesus Cristo existiam os fragmentos (diegesis), que foram editados pela igreja de Jerusalém até o ano de 50 d.C. Formavam o fundamento de ensino do cristianismo primitivo. Era de esperar que também enfatizassem os escritos que chamamos de evangelhos.

No sentido acima, os fragmentos tiveram influência sobre os escritos de Marcos, pois este evangelista adotou a versão transmitida e ampliada por Pedro com as suas experiências pessoais.

O evangelho segundo Mateus recebeu o seu nome do fato de ter incorporado, além da tradição dos fragmentos de Jerusalém, as palavras de Jesus transmitidas pelo apóstolo Mateus. Não sabemos quem é o autor desse evangelho tão abrangente. Ele provavelmente vem do meio judaico, pois tenta demonstrar que a história de Israel se cumpre na vida, sofrimento, morte e ressurreição de Jesus.

O evangelho de Lucas está baseado em um discípulo de Paulo, de quem ele aprendeu o significado do evangelho para os gentios. Ele está fascinado por esse evangelho. Ele conhece a grande variedade das versões escritas da vida de Jesus, faz uma avaliação delas, aprofunda-se nas pesquisas, descobre fatos novos, que não tinham sido divulgados até então, e coloca tudo numa redação própria, em que o evangelho para os gentios define o objetivo teológico do seu escrito (Lc 1.1-4).

Godet acredita que os três evangelhos surgiram na mesma época em três lugares diferentes e de forma independente um do outro: Marcos em Roma (64), Mateus no oriente (66) e Lucas na Síria (66). Até que ponto é possível comprovar essa suposição será discutido nos capítulos seguintes, em que trataremos cada evangelho separadamente.

No final da sua proposta, Godet deixa transparecer o que o orientou na busca por uma alternativa à teoria das duas fontes. É a questão da confiabilidade dos evangelhos. Na sua opinião, ela é questionada pela hipótese da utilização (dependência literária). É evidente que dessa perspectiva, apóstolos ou discípulos de apóstolos não são levados a sério como portadores de informações ou mesmo como autores dos evangelhos. Para reforçar essa posição, vemos em muitas introduções, a pergunta: Como o apóstolo Mateus iria buscar e depender de informações do discípulo de apóstolo João Marcos? Baseado ainda em outros argumentos, esse questionamento tem o resultado de pôr em dúvida a autoria de Mateus para o primeiro evangelho, o que contraria a posição da igreja antiga. Com isso a confiança de muitas pessoas nos evangelhos certamente foi abalada.

Se, no entanto, conseguimos provar que por trás dos evangelhos está a versão dos apóstolos, fortaleceremos a confiabilidade dos conteúdos a nós transmitidos. Também será mais fácil entender por que a concordância em todos os detalhes não era possível nem necessária. Com isso, os evangelhos ganham o caráter de relatos de testemunhas que, exatamente pela sua diversidade, se tornam tanto mais confiáveis.

O estudante do NT que está convencido da veracidade e da confiabilidade da transmissão bíblica dos fatos, saberá avaliar a proposta de Godet e usará as sugestões para a solução do problema sinóptico como estímulo para a reflexão mais profunda sobre o assunto. Isso porque as incertezas quanto à teoria das duas fontes são evidentes e é necessário buscar soluções alternativas. É preciso estar aberto para a possibilidade de uma forma modificada de a hipótese dos fragmentos ser demonstrada como o modelo mais convincente de solução do problema sinóptico.


Fonte:  Introducao e Sintese do Novo Testamento - Gerhard Horster

Os Evangelhos - A teoria das duas fontes


Essa proposta se baseia em duas colunas: Marcos é a base para Mateus e Lucas (Marcos foi o primeiro) e Mateus e Lucas fizeram uso do documento dos discursos (Q) e o incorporaram nos seus evangelhos. Além disso, os sinópticos ainda usaram outras fontes para o material exclusivo que apresentam.

Em favor de Marcos como o texto primitivo existem os seguintes argumentos:

1) Marcos é o mais curto dos primeiros três evangelhos. Por causa do enorme respeito que existia na igreja primitiva pelo santo texto dos evangelhos, é mais provável que tenha havido uma expansão do que um resumo do texto. Por isso o texto mais curto é o mais antigo.
2) Mateus e Lucas só se assemelham na estrutura, no conteúdo, na seqüência e na formulação do texto naquelas passagens básicas em que são paralelos a Marcos. Como exemplo disso servem os capítulos 4 e 5 de Marcos com os seus paralelos com os outros dois evangelhos.
3) Marcos apresenta pouco material que aparece somente no seu evangelho. O texto exclusivo de Mateus e Lucas se extende por vários capítulos.
4) Parece que, em comparação com Marcos, partes de Mateus e Lucas apresentam correções lingüísticas e de conteúdo. Às vezes Mateus e Lucas concordam nessas correções, às vezes não.

Alguns exemplos de correções lingüísticas: Marcos 2.4ss; 2.7 e paralelos. Exemplos de correção do conteúdo: Marcos 6.14 e Mateus 14.1; Marcos 2.15 e Lucas 5.29.

As conclusões dessas observações são: Mateus e Lucas conheciam o evangelho de Marcos e se basearam nele. Portanto, Marcos deve ser o evangelho mais antigo. Talvez tenha havido um “Marcos-primitivo”, no qual Lucas se baseou. Isso explicaria algumas diferenças entre Mateus e Lucas.

A favor do documento Q existem os seguintes argumentos:

1) Mateus e Lucas concordam — em parte literalmente — até nos textos que os dois têm a mais do que Marcos. Isso nos leva à conclusão de uma dependência literária na formulação do texto grego. Como exemplo compare Mateus 3.7-10 e Lucas 3.7-9.

2) Nos textos que Mateus e Lucas têm a mais do que Marcos não há só discursos de Jesus. Há também relatos dos atos de Jesus. Nesse aspecto, a designação “fonte dos discursos” é enganosa.

Exemplos: Mateus 4 comparado com Lucas 4; Mateus 8.5-13 e paralelos, 18-22 e paralelos; Mateus 11.1-19 e paralelos.

3) Nos relatos do sofrimento não é possível descobrir esses trechos. Aqui cada evangelista segue a sua própria linha.

4) Mateus e Lucas organizam o material de formas diferentes: Mateus apresenta os discursos em vários agrupamentos (Mt 5—7; 10; 13; 18; 24-25) e Lucas em dois blocos (6.20—8.3; 9.51—18.14). Isso mostra que os dois evangelhos não são completamente dependentes entre si, mas que se basearam em uma fonte textual comum.

Vamos resumir as conclusões sobre o documento dos discursos:
Provavelmente existiu uma versão dos discursos e dos atos de Jesus na língua grega, que Mateus e Lucas conheceram e usaram. Essa fonte se perdeu. Ela se tornou conhecida como o documento dos discursos. Como ele era em detalhes não sabemos. Conclui-se disso que os trechos de Mateus e Lucas em que eles se assemelham fortemente pertenciam a esse documento, enquanto Marcos não incorporou no seu evangelho essa tradição.

O documento dos discursos é, portanto, uma reconstrução literária baseada nos evangelhos que conhecemos. Não está comprovado como fonte documental.

Para complementar a teoria das duas fontes ainda é necessário um comentário sobre o material exclusivo que pode ser achado somente em Mateus ou somente em Lucas. Já não é possível saber se os autores dispunham de uma transmissão oral ou escrita desse material exclusivo. Mais frutífera é a reflexão sobre as ênfases teológicas dos textos exclusivos de cada um, pois esses textos nos dão indicações da mensagem que cada evangelista queria transmitir.



Fonte:  Introducao e Sintese do Novo Testamento - Gerhard Horster

O Problema Sinóptico (Os Evangelhos - Bíblia)


Quando comparamos os primeiros três evangelhos, constatamos dois aspectos que se contrapõem:

1) Os sinópticos são semelhantes em longos trechos na estrutura, na seqüência das perícopes e também na forma do texto grego.
2) Os sinópticos se diferenciam na escolha dos temas, na apresentação do contexto da narrativa e freqüentemente também na forma do texto grego.

O problema sinóptico é o seguinte: como podemos explicar essas constatações com base na história da origem dos evangelhos?

Na história da teologia foram dadas diversas respostas a essa questão. Agostinho (354-430) cria que os evangelhos foram escritos na seqüência em que aparecem no NT hoje: Marcos era uma forma resumida de Mateus e Lucas uma forma ampliada de Marcos. Somente na segunda metade do século XVIII o problema sinóptico passou a receber mais atenção. Os estudiosos chegaram a quatro tentativas de solução:

1.3.1 A hipótese do protoevangelho
Além de outros estudiosos, Lessing a defendeu em 1776. Ele partiu do ponto de que no início da transmissão do evangelho existiu um antigo evangelho aramaico, o evangelho dos Nazarenos. Ele tinha notícia de que Jerônimo tinha achado esse evangelho na seita dos Nazarenos no quarto século d.C. Fragmentos desse evangelho foram publicados e existem até hoje. Provavelmente, no entanto, esse evangelho não seja um texto original, e sim uma retradução dos evangelhos sinópticos gregos para o aramaico, que surgiu na primeira metade do século II.

Além disso, um protoevangelho aramaico não resolveria o problema sinóptico, pois a semelhança literal do texto grego permaneceria. Seria necessário supor também que tivesse sido feita uma tradução uniforme do grego sobre a qual os sinópticos se basearam.

Com essas falhas, a solução de Lessing não conseguiu se impor.

1.3.2 A hipótese dos fragmentos
De acordo com essa sugestão, os evangelhos sinópticos são constituídos de inúmeros pequenos fragmentos que foram registrados pelos apóstolos e seus ouvintes. Nisso teriam imitado os alunos dos rabinos judaicos que também anotavam os ensinos e atos dos seus mestres. Teria havido um interesse muito grande por esses registros, por isso teriam sido traduzidos para o grego rapidamente. Os sinópticos teriam então colecionado esses fragmentos (do grego diegesis = relato, narrativa) e incorporado aos seus evangelhos. O evangelho de Lucas tem a referência a esses relatos no seu início (Lc 1.1-4).

Essa proposta de solução foi defendida primeiramente por Schleiermacher em 1817 e complementada em 1832 pela suposição de que no evangelho de Mateus teria sido elaborada uma coletânea de oráculos de Jesus.

A hipótese dos fragmentos tem muitos argumentos a seu favor, principalmente o início do evangelho de Lucas. Aceitando como pressuposto a tradução dos fragmentos para o grego, ela explicaria inclusive a semelhança literal dos evangelhos sinópticos. Ela deixa de explicar, no entanto, a semelhança da estrutura e da seqüência das perícopes nos sinópticos. Por isso os estudiosos do NT não se satisfizeram com essa proposta.

1.3.3 A hipótese da tradição
Essa proposta foi defendida em 1796/97 por Johann Gottfried Herder em conjunto com a sugestão de Lessing. Se Lessing pressupunha um protoevangelho aramaico, Herder partia de um protoevangelho oral. Essa observação é importante até hoje: no início da transmissão do evangelho existiu presumivelmente a transmissão oral das palavras e dos atos de Jesus. Mas visto que essa transmissão oral provavelmente aconteceu na língua aramaica, a proposta não explica a semelhança na estrutura e na seqüência e nem a semelhança literal do texto grego.

Portanto, não é possível resolver o problema sinóptico dessa forma.

1.3.4 As hipóteses da utilização (da dependência literária)
Enquanto as três propostas estudadas acima tentam trabalhar sem a dependência literária entre os três primeiros evangelhos, as hipóteses da utilização colocam a dependência como condição.

Já citamos Agostinho e a sua solução que encontrou adeptos até no século XX (entre eles Theodor Zahn e, com restrições, Adolf Schlatter). Ele parte do princípio de que os evangelhos surgiram na seqüência em que estão no NT hoje. Assim, o evangelho de Mateus é o mais antigo, o evangelho de Marcos um extrato de Mateus, e Lucas se baseia nos dois.

Griesbach defendeu uma outra dependência. Ele também considera o evangelho de Mateus o mais antigo. O evangelho de Lucas dependeria de Mateus e o evangelho de Marcos seria um breve resumo dos outros dois. Essa hipótese não encontrou muitos simpatizantes por estar baseada em número excessivo de suposições.

A hipótese que se impôs foi a que Lachmann desenvolveu em 1835. Ele considerava o evangelho de Marcos o mais antigo. Os outros dois teriam se baseado, independentemente um do outro, em Marcos. Lachmann fundamentou a sua solução do problema sinóptico no fato de que Mateus e Lucas só concordam entre si na seqüência das perícopes quando têm a mesma seqüência de Marcos. No restante eles ordenam o seu material de forma totalmente autônoma.

A hipótese de Lachmann foi complementada por H. J. Holtzmann, que descobriu, ao comparar Mateus e Lucas, que estes dois evangelhos são caracterizados por uma semelhança quase literal nos textos que têm a mais do que Marcos, diferenciando-se, no entanto, na seqüência dos textos apresentados. Disso ele concluiu que Mateus e Lucas se basearam num texto grego comum. Ele chamou esse texto de fonte dos discursos, pois consiste em grande parte de discursos ou ditos, de Jesus. Hoje o texto é chamado também de documento dos logia, ou simplesmente, o documento Q (de “Quelle” = “fonte” em alemão).

Com isso estava formada a teoria das duas fontes, que diz que os evangelhos sinópticos se baseiam em duas fontes: no evangelho de Marcos e no documento Q. Visto que as conclusões faziam sentido e a hipótese era fácil de se aplicar, ela se tornou a proposta predominante para a solução do problema sinóptico até os dias de hoje. Recentemente, no entanto, tem surgido novamente a pergunta, se essa hipótese é realmente a mais adequada para o problema. Por essa razão apresentaremos nos próximos parágrafos os detalhes dos argumentos que apóiam essa teoria.



Fonte:  Introducao e Sintese do Novo Testamento - Gerhard Horster

As características peculiares dos quatro evangelhos


Quem compara os quatro evangelhos do NT percebe logo que os primeiros três são surpreendentemente semelhantes. Por isso são chamados de sinópticos. O quarto evangelho segue o seu próprio estilo de apresentação.

Os sinópticos e João são distintos nos seguintes aspectos:

No esboço:
Os sinópticos têm uma estrutura simples nos seus evangelhos. Após o batismo de Jesus são relatados os fatos ocorridos na Galiléia. Depois segue um relato de extensões variadas sobre a viagem de Jesus a Jerusalém. Na terceira parte é contado o que se passou em Jerusalém. Essa mesma estrutura pode ser observada, por exemplo, nas seguintes passagens de Marcos: 1.14; 8.27; 10.1,32.

Em contraposição a isso, o evangelho de João descreve várias peregrinações de Jesus da Galiléia a Jerusalém. A razão era, na regra, a comemoração das festividades judaicas de que Jesus participava com os seus discípulos em Jerusalém. Desses dados do evangelho de João se consegue calcular o tempo do ministério público de Jesus. Durou em torno de três anos. A movimentação dele entre a Galiléia e Jerusalém pode ser observada nos seguintes textos: João 2.1,13; 3.22; 3.2,4-6; 5.1; 6.1; 7.1s,10; 10.40; 11.7,54s; 12.1,12.

Na forma de ordenação do material:
Do que foi descrito acima se conclui que os sinópticos organizaram o seu material do ponto de vista geográfico, enquanto o evangelho de João está construído sobre uma estrutura biográfica. Ele quer que os seus leitores acompanhem o ministério de Jesus na seqüência e no período em que os fatos se desenrolaram.

Na escolha dos temas:
Os sinópticos relatam uma quantidade significativa dos atos de Jesus, entre eles muitos milagres, principalmente curas. Em contraposição a isso o evangelho de João só contém sete relatos sobre atos de Jesus sendo que nenhuma expulsão de demônios.

Três desses fatos são contados também pelos sinópticos: a purificação do templo, a cura do servo de um oficial do rei e a multiplicação dos pães para os 5.000.

Na apresentação dos adversários de Jesus:
Os sinópticos descrevem os adversários de Jesus com as suas características e tarefas diferenciadas: fariseus e escribas, saduceus e sacerdotes. Na comparação com isso sobressai o fato de que no evangelho de João os oponentes de Jesus são denominados judeus. Se isso quer dizer o povo judeu todo, ou a liderança ou um grupo específico do povo, só pode ser descoberto pelo contexto.

Na forma da narrativa:
Os evangelhos sinópticos contêm muitos relatos breves da vida de Jesus que freqüentemente culminam com uma declaração marcante de Jesus. Os protagonistas da situação só são apresentados até o ponto em que contribuem para o objetivo da declaração do relato. O leitor não descobre nada mais sobre outros aspectos das suas vidas. Em contraposição a isso, o evangelho de João traz relatos detalhados de acontecimentos da vida de Jesus, como por exemplo o diálogo com a mulher em Samaria (cap. 4), a cura do cego de nascença (cap. 9) ou a ressurreição de Lázaro (cap. 11).

Na apresentação dos discursos de Jesus:
Os quatro evangelhos contêm discursos de Jesus mais ou menos abrangentes. Nos sinópticos eles consistem em frases curtas e fáceis de serem guardadas. Trata-se na verdade de uma coletânea de declarações ou citações dos discursos de Jesus e não de discursos completos. No evangelho de João isso é diferente. Lá encontramos discursos que levam à reflexão e meditação. O leitor consegue se imaginar na posição do orador. Compare por exemplo Lucas 15.1-7 com João 10.

Nota-se também que nos sinópticos o estilo de oratória é direto, objetivo e linear, correspondendo assim ao pensamento grego. Já nos discursos de Jesus em João o desenvolvimento das idéias se dá em círculos, trabalhando com constantes repetições. Isso não quer dizer que sejam meras repetições. O que acontece é que um pensamento é repetido em outro nível para que possa ser melhor interiorizado. Para entender isso melhor é preciso pensar em uma espiral. É assim que se falava no dia-a-dia no oriente.

Na autodenominação de Jesus:

Quando Jesus fala de si mesmo nos evangelhos sinópticos ele usa um título incomum. Ele se denomina bar naschah, ou seja, Filho do Homem, ou Homem. O Filho do Homem é o conceito-chave para a compreensão de Jesus nos sinópticos.

Também no evangelho de João se fala do Filho do Homem. Mais importantes, no entanto, são as autodenominações Filho de Deus, ou Filho. O quarto evangelho nos proporciona uma visão especial sobre o relacionamento único entre Deus e Jesus.

Quais são as razões para a apresentação tão variada da vida e do ministério de Jesus?

Enquanto os sinópticos ordenam todo o material que lhes foi transmitido do ponto de vista geográfico, o quarto evangelista descreve, como testemunha ocular, a caminhada de Jesus nas suas etapas.

Ao passo que os sinópticos têm pouco interesse por detalhes geográficos e topográficos, o quarto evangelista conta os detalhes até então desconhecidos da vida de Jesus.

Enquanto os sinópticos querem ressaltar o máximo de declarações e citações dos discursos de Jesus, o quarto evangelista sublinha o estilo de oratória de Jesus. Ele quer que os seus leitores tenham condições de vivenciar os discursos de Jesus.

Enquanto os sinópticos reconhecem como sua tarefa principal fixar e preservar o que aconteceu no passado por meio de Jesus (cf Lc 1.1-4), o quarto evangelista interpreta a vida e as palavras de Jesus do ponto de vista da Páscoa. Repetidas vezes ele ressalta que os discípulos só entenderam o que estava acontecendo após a ressurreição de Jesus dos mortos.

É errado, no entanto, afirmar que os sinópticos estavam mais preocupados com a história, enquanto o quarto evangelista anunciava a Jesus e não dava tanta importância à exatidão histórica no seu relato. Na verdade, o que acontece é o contrário: os sinópticos também querem anunciar a Jesus; para isso eles se baseiam na tradição histórica. O quarto evangelho se apresenta como o relato de uma testemunha ocular preocupado até as últimas minúcias com a exatidão da transmissão dos fatos. Isso não está em contradição com a proclamação de Jesus como o Filho de Deus. Os quatro evangelhos são endereçados a grupos diferentes de leitores. Isso leva a ênfases diferenciadas na apresentação de Jesus.


Fonte:  Introducao e Sintese do Novo Testamento - Gerhard Horster