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domingo, 24 de novembro de 2013

O sofrimento em John Bunyan


“Contudo, já em nós mesmos, tivemos a sentença de morte, para que não confiemos em nós e sim no Deus que ressuscita os mortos” (2Co 1.9).1

Para que não confiemos em nós e sim em Deus. O entendimento do versículo acima foi fundamental e encorajador para John Bunyan (1628-1688) em sua peregrinação e sofrimento. E o sofrimento em Bunyan é o tema deste artigo, o qual será dividido em cinco partes, sendo elas:

1 – Introdução ao tema e contexto histórico
2 – Uma breve biografia de John Bunyan
3 – Um breve apanhado do pensamento de Bunyan
4 – O sofrimento em John Bunyan
5 – Aplicações do sofrimento de Bunyan para nossa peregrinação cristã, como indivíduos crentes em Cristo Jesus e como igreja e comunidade cristã.

Em maior ou menor grau, o sofrimento por causa de seguir e testemunhar de Cristo tem atingido a vida dos discípulos de Cristo em todas as épocas e em todos os lugares. O sofrimento é algo que faz parte da vida e é compatível com o Novo Testamento. Livros como os de Jó e do profeta Habacuque mostram como o povo da aliança deve se portar diante do sofrimento. Na história da igreja também não foi diferente. Mártires e servos de Deus deixaram um exemplo e legado sobre como enfrentar e encarar o sofrimento de forma que o nome de Deus seja glorificado. Não numa perspectiva de autopiedade diante do sofrimento, mas entendendo-o como um mecanismo para que Deus seja glorificado em nossas vidas, em nossas lutas, aflições e dores. Assim foi com John Bunyan, latoeiro de origem humilde e pregador puritano de uma igreja batista no século XVII, conhecido pelo livro de sua autoria, O Peregrino. Não sei se alguém dentre os leitores já foi preso por pregar o evangelho, já teve alguma filha nascida cega, já foi ameaçado de morte por causa da pregação. Provavelmente alguns já perderam um ente querido, sofreram acidentes ou algum outro acontecimento que tenha causado dor e aflição em sua vida. Minha oração é que Deus abençoe você, sustentando-o(a) e encorajando-o(a), através do legado que foi deixado por Bunyan.

John Bunyan
Era um período turbulento na Inglaterra do século XVII. Eclodiram controvérsias em torno da monarquia e da liturgia da Igreja estatal, em questões de cerimônias e trajes clericais, resquícios da Igreja Católica. Elizabeth, Tiago I e Carlos I (este coroado rei em 1625) sempre foram avessos aos Puritanos. De 1645 a 1649 houve a guerra civil e a cavalaria puritana estava sob a liderança de Oliver Cromwell, e vencida a guerra com a morte de Carlos I, o parlamento e a república são instalados. Dois anos depois da morte de Cromwell, Carlos II ascende ao trono em 1660 e a monarquia é restaurada. Em 1662 mais de dois mil pastores puritanos foram desligados de suas igrejas e quem não fosse anglicano não poderia colar grau nas melhores universidades.

Dentro dessa confusão nasce John Bunyan, em novembro de 1628, em Elstow, Bedford, Inglaterra. Ele era filho de um latoeiro pobre, que pôde oferecer apenas a educação primária e básica ao seu filho. Quando jovem, Bunyan levou um estilo de vida promíscuo, mundano e blasfemador. Quanto a esse período, ele escreve: “Sendo totalmente injusto, estava feliz por ser cativo do diabo, para cumprir a sua vontade (2 Tm 2:26).”2 E ele sentia uma espécie de prazer e satisfação neste estilo de vida “plenamente de acordo com as inclinações da minha natureza caída, entreguei-me a desejos pecaminosos e deleitava-me em todas as formas caídas de transgressão contra a lei de Deus”3 e exercia influência sobre seus companheiros motivando-os a seguirem o mesmo comportamento não se importando muito com questões como céu e inferno, salvação e condenação. 

 Entre 1644 e 1647 serviu no exército parlamentar liderado por Oliver Cromwell, na guerra contra Carlos I. Casou-se em 1649. Sua esposa teve pais piedosos, e através dela Bunyan começou a ter contato com o evangelho. Após vários anos, ele encontrou três ou quatro senhoras sentadas ao sol numa tarde, conversando sobre o novo nascimento. Estas senhoras o apresentaram ao Pastor John Gifford e à sua congregação. Ao que tudo indica, ali Bunyan encontrou a paz que excede a todo entendimento. Esse pastor havia sido médico charlatão no exército, mas experimentara uma conversão dramática.

Após sua regeneração e maravilhosas experiências com a paz de Deus, Bunyan escreveu em sua autobiografia, “Graça abundante ao principal dos pecadores”:

(...) um dia, enquanto andava pelo campo, as seguintes palavras subitamente adentraram minha alma: “Sua justiça está no céu”. Além disso, pensei ter visto, com os olhos da minha alma, Jesus Cristo à destra de Deus. Minha justiça estava no céu; de modo que, onde quer que eu estivesse, ou independentemente do que eu fizesse, Deus não poderia dizer a respeito de mim: “Ele necessita da minha justiça”, pois minha justiça estava bem diante dele.4
De sua primeira união conjugal nasceram quatro filhos, sendo Mary, a primogênita, cega de nascimento. Sua esposa faleceu em 1655 e alguns anos depois, em 1659, Bunyan casou-se pela segunda vez com Elizabeth, que cuidou de seus quatro filhos.

Resolvidos os conflitos de sua alma, Bunyan começou a exortar a igreja em 1655, e foi levantado como um grande pregador em Bedford. Sua popularidade como pregador leigo foi muito grande. Em 1660 foi preso por não ser licenciado para pregar pela Igreja da Inglaterra e por não se adequar aos padrões da liturgia anglicana. Essa prisão causou grande opressão em sua família e houve um interrogatório com sua esposa. Ela disse que o marido jamais deixaria de pregar. O próprio Bunyan confirmou isso quando lhe foi oferecida a liberdade em troca da renúncia à pregação. Disse ele: “Se eu for solto hoje, pregarei amanhã”. Essa sua determinação custou-lhe doze anos de prisão. Por bondade do carcereiro, Bunyan podia visitar sua família, porém viveu esse tempo sob tensão de ser penalizado com a morte a qualquer momento. Nessas visitas, ele mantinha contato com amigos em Londres e participava das reuniões regulares da igreja em Bedford, sendo eleito seu copastor. Porém, quando suas saídas foram descobertas, Bunyan, por iniciativa própria, diminuiu o ritmo de suas visitas para não prejudicar o trabalho do carcereiro.

Após os doze anos de prisão, ele foi solto por um decreto de Indulgência Religiosa. Logo depois foi licenciado para pregar como pastor da igreja em Bedford. Um celeiro virou edifício religioso e ali Bunyan pregou até sua morte. Entre 1675 e 1677 Bunyan foi novamente encarcerado. Seus biógrafos sugerem que nesse período foi escrito O Peregrino. 

Bunyan deixou suas posses para a família, para esta não ser prejudicada. Em agosto de 1688, ele viajou oitenta quilômetros a cavalo para pregar em Londres, debaixo de forte chuva. Ali contraiu febre e viajou para a pátria celestial aos sessenta anos de idade. Seu último sermão fora em 19 de agosto, baseado em João 1.13, e suas últimas palavras em púlpito foram: “Vivam como filhos de Deus, para que possam olhar a seu Pai no rosto, com segurança, mais um dia”.

RECORTES DO PENSAMENTO E DA TEOLOGIA DE JOHN BUNYAN
Três obras exerceram grande influência sobre o pensamento de John Bunyan. A primeira foi o comentário de Martinho Lutero à Epístola aos Gálatas; os outros dois livros foram O caminho do céu para o homem simples e a Prática da piedade.

Além de pastor de ovelhas e fervoroso pregador, Bunyan foi um profícuo escritor. Antes da primeira prisão já havia escrito dois livros. Durante seu aprisionamento escreveu algumas obras, sendo elas: Oração no Espírito, A Ressurreição da Cidade Santa, Graça Abundante ao Principal dos Pecadores (autobiografia), O Peregrino, Defesa da doutrina da justificação, e Contra o Bispo Fowler. Além desses, também são conhecidos: A Peregrina e A Guerra Santa. Segundo alguns biógrafos e estudiosos, Bunyan foi influente na formação da Confissão de Fé Batista de 1677, que resultou de influência e aprimoração da Confissão de Fé de Westminster, e que se tornou conhecida como a Confissão de Fé de 1689, visto que nessa ocasião foi subscrita por representantes de mais de cem igrejas batistas.5

Segundo D. Martin Lloyd-Jones, o principal interesse de Bunyan eram as almas, e este interesse era a mola propulsora de toda a sua atividade.6 Devido as suas experiências de tormento interno, tornou-se um pastor devoto e interessado nas almas de seus fiéis. Além disso, tinha ele um conceito de fé e crença não somente cognitivo, numa apreensão intelectual apenas, mas que também aquecesse o coração com poder causando mudança de vida.

Bunyan tinha um interesse enorme pela doutrina da justificação, influenciado talvez pela leitura do Comentário da Epístola aos Gálatas, pelo reformador Martinho Lutero. Podemos ouvir a voz do interesse de Bunyan nessa doutrina quando lemos o que a Confissão de 1689 diz sobre ela, em seu capítulo 11, seção 1:

Aqueles a quem Deus chama eficazmente, Ele também os justifica, gratuitamente; não por infundir-lhes justiça, mas perdoando-lhes os pecados, considerando-os e aceitando-os como pessoas justas; não por coisa alguma realizada neles ou por eles mesmos feita, mas unicamente por consideração a Cristo; não por imputar-lhes como justiça a fé, o ato de crer, ou qualquer outra obediência evangélica, mas por imputar-lhes a obediência ativa de Cristo (a toda a lei) e sua obediência passiva (na morte), como total e única justiça deles, que recebem a Cristo e nEle descansam, pela fé. E esta fé, não a tem de si mesmos, é Dom de Deus.7
Bunyan se envolveu também em controvérsias. Uma delas foi em relação aos batistas particulares restritos. Esse grupo era reformado em sua soteriologia (doutrina da salvação), negando, porém, a comunhão a outras denominações. Bunyan também era ligado a uma igreja batista particular, sendo, portanto, calvinista – prova disso foi um folheto publicado em 1674 chamado Reprovação Assegurada.8 Porém, ele era “aberto” quanto a comunhão com presbiterianos, anglicanos e congregacionais, assim como com todo que cresse na doutrina da justificação da maneira ensinada nas Escrituras. Ele cria no batismo conforme os distintivos batistas, mas não via nisso um impedimento para comunhão com outras denominações. Sua luta era pela fé cristã em sua essência, assim como Richard Baxter que uma vez disse: “Nas coisas essenciais, unidade; nas não essenciais, liberdade; e em todas as coisas, caridade”. Esse também era o espírito da batalha de Bunyan.

Bunyan também militou contra os Quacres, grupo que acreditava no cristianismo apenas como uma luz interior, tendendo para o misticismo. Ele argumentava que as certezas históricas são essenciais à fé cristã. Não é fé verdadeira aquela que não puder descansar nessas verdades essenciais.

Alguns heróis na fé expressaram honra a Bunyan:

•    John Burton, que prefaciou a primeira obra de Bunyan em 1656, disse em sua defesa: “Este homem não foi escolhido de 
uma universidade secular, mas de uma universidade celestial, a Igreja de Cristo”.
•    John Owen, um dos maiores teólogos da época, congregacional, ao ser indagado pelo Rei Carlos II sobre o fato de um latoeiro inculto pregar, respondeu: “Pudesse eu possuir as habilidades do latoeiro para pregar, e, se apraz a sua majestade, alegremente renunciaria a todo meu estudo”.
•    George Whitefield, grande pregador puritano, disse sobre a obra O Peregrino: “Tem cheiro de prisão”. E prossegue: “Foi escrito quando o autor estava confinado na cadeia de Bedford. E os ministros nunca pregam ou escrevem tão bem como quando estão debaixo da Cruz: o Espírito de Cristo e da Glória repousa sobre eles.”
•    Charles Haddon Spurgeon, o batista “príncipe dos pregadores”, que lia O Peregrino uma vez por ano, disse acerca de Bunyan: “Fure-o em qualquer parte; e você verá que o sangue dele é biblino, a própria essência da Bíblia flui dele. Ele não consegue falar sem citar um texto, pois sua alma está cheia da Palavra de Deus.”

O SOFRIMENTO EM JOHN BUNYAN
Aqui chegamos ao ponto principal deste artigo, isto é, o efeito do sofrimento na vida e peregrinação de John Bunyan.

Como dissemos anteriormente na parte biográfica, Bunyan foi preso durante doze anos por pregar o evangelho sem ser licenciado pela Igreja da Inglaterra. Além de ser um latoeiro pobre e sem muita instrução formal, sua primeira filha Mary era cega de nascença. Ainda que na prisão desfrutasse de certa liberdade de congregar e visitar sua família, Bunyan vivia sob tensão de condenação à morte todo o tempo. Ele às vezes ficava atormentado por uma dúvida de ter tomado a decisão certa e deixado sua família em fortes dificuldades econômicas e passando necessidades.

O pastor batista norte-americano John Piper ilustra cinco efeitos do sofrimento na vida de John Bunyan e pediremos ajuda a ele neste momento:9

Em primeiro lugar, o sofrimento de Bunyan confirmou o seu chamado como escritor para a igreja aflita.  
Como prisioneiro, assim como o apóstolo Paulo escreveu algumas epístolas nessa condição, Bunyan dedicou seu tempo no cárcere aos escritos. Livros foram o seu maior legado à Igreja e ao mundo. Os escritos de Bunyan eram uma extensão, um braço de seu ministério pastoral, dirigido principalmente as ovelhas de Bedford, que viviam em constante perigo de assédio e prisão.

Podemos ouvir e sentir o sofrimento de Bunyan quando lemos trechos d´O Peregrino.10 No capítulo 9, Cristão sobe ao Monte da Dificuldade que representava as circunstâncias que exigem renúncia e esforço especial. Depois de beber um pouco de água na fonte, Cristão começou a subir dizendo:

Este monte, embora alto, anelo subir,
A dificuldade não me ofenderá,
Percebo que este é o caminho certo à vida.
Anima-te meu coração,
Não desanimemos nem temamos.
Embora difícil, é melhor o caminho certo seguir
Do que o caminho errado, embora fácil,
Cujo fim é a maldição.
No capítulo 12, Cristão vence a travessia do Vale da Sombra da Morte, que tinha o propósito de descrever uma passagem por aflições íntimas. Depois do diálogo com dois homens, Cristão prosseguia com a espada desembainhada temendo assalto. Assim, Bunyan narra o sonho: “Também, nesse mesmo vale o caminho era muitíssimo estreito; por isso, o bom Cristão sentiu-se desafiado ainda mais. Pois, ao procurar no escuro evitar a vala, à direita, estava sujeito a se desequilibrar e cair no lamaçal, à esquerda. E, quando procurava com muito cuidado escapar do lamaçal, estava prestes a cair na vala. Assim, prosseguiu”.

Em segundo lugar, o sofrimento de Bunyan aumentou o seu amor pelo rebanho e deu ao seu trabalho pastoral percepções da eternidade. 
Ele pregava como quem sentia dores de parto pelos seus filhos espirituais. Isso é muito claro n´O Peregrino, com a trajetória de Cristão rumo à Cidade Celestial. Assim como o sofrimento o fazia perceber que era um peregrino na terra, Bunyan buscava transmitir isso ao seu rebanho em Bedford. Debaixo de sua pregação, várias congregações foram fundadas e sua igreja tinha, talvez, cento e vinte membros. Ele amava o que fazia e amava intensamente o seu trabalho. Isso fazia com que ele passasse o gosto da eternidade para seu rebanho.

Em terceiro lugar, o sofrimento de Bunyan o fez entender que seguir a Jesus Cristo significa ir contra o vento e remar contra a maré.
Em vários de seus sermões e escritos ele sempre deixou isso claro. No capítulo 15 d´O Peregrino, Cristão encontra o personagem Sr. Interesse-Próprio e em um diálogo conflitante, Cristão expõe a Interesse-Próprio o preço do discipulado: “Se quiser ir conosco, terá de se posicionar contra o vento e contra a maré, todavia, percebo que isto é contrário à sua opinião. Também deve confessar a religião, tanto em seus trapos quanto em sapato de prata; e defendê-la, quer esteja ela presa em algemas, quer esteja caminhando nas ruas com aplausos”.

Dietrich Bonhoeffer (1906-1945) foi um teólogo e pastor luterano que resistiu ao nazismo na Segunda Guerra Mundial. Ele teve cassado seu direito de pregar e ensinar, sendo preso em 1945, e depois morto uma semana antes da guerra acabar. Ainda que sob uma teologia às vezes controvertida, Bonhoeffer escreve um livro, Discipulado, na pele de quem viveu seguindo contra o vento e a maré. Acerca do preço de ser discípulo de Cristo, ele diz o seguinte: 

O discípulo é arrancado de sua relativa segurança de vida e lançado à incerteza completa (i.é, na verdade para a absoluta segurança e proteção da comunhão com Jesus); de uma situação previsível e calculável (i.é, de uma situação totalmente imprevisível) para dentro do imprevisível e fortuito (na verdade, para dentro do que é unicamente necessário e previsível); do domínio das possibilidades finitas (i.é, na realidade, as possibilidades infinitas) para o domínio das possibilidades infinitas (i.é, para a única realidade libertadora). (...) A chamada ao discipulado é, no entanto, comprometimento exclusivo com a pessoa de Jesus Cristo.11
Antes de sua morte, perguntaram a Bonhoeffer se era o fim, e ele respondeu: “Não é o fim, é apenas o começo”. Isso ilustra que nossa confissão de fé deve ser acompanhada de nossa prática de vida, custe o que custar, assim como foi com Bonhoeffer e com Bunyan.

Em quarto lugar, o sofrimento de Bunyan fortaleceu a sua certeza de que Deus é soberano sobre todas as aflições dos seus, e lhes dá a certeza da segurança. 
Aqui John Piper escreve:

Sempre houve, como há hoje, pessoas que tentam resolver o problema do sofrimento, negando a soberania de Deus – isto é, o governo providencial de Deus sobre Satanás, a natureza e o coração do homem. Porém, é notável que muitos dos que defendem a doutrina da soberania de Deus sobre o sofrimento têm sido os que mais sofreram, e os que mais encontraram nesta doutrina o maior conforto e ajuda.12
Neste ponto, recorrendo à experiência de Bunyan, Piper contesta a heresia do chamado “Teísmo Aberto” ou “Teísmo relacional”. Este ensinamento, de um modo geral, defende que Deus abriu mão da sua soberania por amor, a fim de se relacionar com seres humanos, sendo então incapaz de prevenir desastres sociais e pessoais, como, por exemplo, os Tsunamis no sudeste da Ásia. 

Em quinto e último lugar, o sofrimento de Bunyan aprofundou nele a confiança na Bíblia como Palavra de Deus, para sua perseverança. 
Na prisão, Bunyan percebeu como a Palavra de Deus lhe transmitia conforto e consolo. Ela é a chave da nossa perseverança!

Em nossos dias as Escrituras são reputadas como insuficientes em diversas áreas. Em academias teológicas elas têm sido consideradas apenas relatos mitológicos, ou, como ouvi de uma professora de Antigo Testamento, “um panfleto javista”. No neopentecostalismo a Escritura tem sido substituída pelo misticismo de várias espécies, como a religiosidade afro-brasileira com linguagem cristã e por uma teologia da prosperidade, que abomina o tipo de sofrimento que estamos expondo aqui, ou uma linguagem da moda e um estilo de culto como “show” para atrair pessoas.

Uma vida cristã perseverante frente às dificuldades existentes só é possível mediante a graça de Deus através das Escrituras, como chave da perseverança.


APLICAÇÕES E CONCLUSÃO
Para terminar, algumas aplicações do sofrimento de Bunyan, para nossas vidas e nossas igrejas.

Devemos aprender com o sofrimento de Bunyan a amar o céu! 
A esperança cristã, como enfatizada na Primeira Epístola de Pedro, nos ajudará junto ao sofrimento, com dor sim, mas suportando e dando graças a Deus pela perseverança. Amados, amemos o céu, amemos a eternidade! Tudo isso aqui é passageiro, e a vida é apenas um hall de espera. Deus tem algo muito maior preparado para nós.

Devemos aprender com o sofrimento de Bunyan a resistir com firmeza no sofrimento. 
O apóstolo Pedro nos diz: “Resisti-lhe firme na fé, certos de que sofrimentos iguais aos vossos estão se cumprindo na vossa irmandade espalhada pelo mundo. Ora, o Deus de toda graça, que em Cristo vos chamou à sua eterna glória, depois de terdes sofrido por um pouco, ele mesmo vos há de aperfeiçoar, firmar, fortificar e fundamentar. A Ele seja o domínio pelos séculos dos séculos. Amém!” (1 Pd 5. 9-11). Tiago igualmente nos exorta quanto a provação: “Meus irmãos, tende por motivo de grande gozo o passardes por várias provações, sabendo que a aprovação da vossa fé produz a perseverança; e a perseverança tenha a sua obra perfeita, para que sejais perfeitos e completos, não faltando em coisa alguma” (Tg 1.2-4). Irmãos e irmãs, sejam quais forem os seus sofrimentos, lembre-se que vocês são crentes em Cristo Jesus! Fiquem firmes com Deus!

Devemos aprender com o sofrimento de Bunyan a meditar mais em nossa liberdade. 
O Brasil é um país livre em relação à crença religiosa. Podemos cultuar, adorar a Deus livremente, e professar nossa fé em qualquer lugar. Às vezes essa liberdade pode causar um relaxamento em nossa adoração e peregrinação cristã. Devemos agradecer a Deus pela liberdade, mas também sermos vigilantes em relação a ela. Uma implicância aqui e acolá em nosso lar, local de trabalho, faculdade, escola ou qualquer outro ambiente em convivência com não crentes, não se compara ao que Bunyan e outros passaram na prisão. Também não devemos dar lugar ao pecado em nossa vida por causa dessa liberdade. A prisão fez de Bunyan um homem santo! “Porque eu sou o SENHOR vosso Deus; portanto santificai-vos, e sede santos, porque eu sou santo” (Lv 11.44a). Seja qual for o pecado contra o qual você estiver lutando, prossiga lutando com Deus para abandoná-lo.

Devemos aprender com o sofrimento de Bunyan a perseverar no ministério que Deus nos colocou
Bunyan foi alguém que desfrutou da graça de Deus para perseverar no ministério diante de todas as dificuldades mencionadas. Ele não foi alguém isento de dúvidas. Pelo contrário, lutou com dúvidas várias vezes. Mas pela graça de Deus foi preservado e perseverou com firmeza no evangelho. Hoje, matérias em mídias populares mostram que há uma alta e significativa porcentagem de pastores que desistem do ministério seja por desgaste emocional e esgotamento espiritual ou algum problema moral. A biografia de John Bunyan é encorajadora para um chamado a perseverança. Seja um pastor de uma igreja estabelecida, ou um líder em uma comunidade com imensos problemas ou um plantador ou revitalizador de igrejas e até mesmo um estudante de teologia aspirando ingressar no ministério, a biografia de John Bunyan pode encorajar você e oferecer luz a sua mente para enxergar a operação da graça de Cristo e manter o coração aquecido enquanto serve no ministério. 

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1O autor agradece ao Pastor Gilson Santos da Igreja Batista da Graça em São José dos Campos – SP pelo desafio de ministrar a palestra biográfica e encorajar a publicação da mesma em formato de artigo além de revisa-la. 
2BUNYAN, John. Graça abundante ao principal dos pecadores: uma autobiografia de John Bunyan. São José dos Campos, Editora Fiel, 2012. P. 20
3Ibid
4Ibid. P. 113
5Cf. online: http://www.crbb.org.br/confissao_sem_transcricao_textos_prova.pdf. Para uma consideração histórica do tema, cf: SANTOS, Gilson. A Confissão de Fé Batista de 1689. Online: http://www.crbb.org.br/gilson4.pdf 
6LLOYD-JONES, D. M. Os Puritanos; suas origens e sucessores. São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1993, pp. 395-425. 
7FÉ PARA HOJE; Confissão de Fé Batista de 1689. São José dos Campos (SP): Editora Fiel,1991, 64p.
8Cf. BUNYAN, John. Reprobation Asserted. Online: http://www.reformed.org/master/index.html?mainframe=/books/bunyan/reprobation/. Acesso em 31/07/2013
9PIPER, John. O Sorriso Escondido de Deus. São Paulo: Shedd Publicações & Edições Vida Nova, 2002, 192p.  
10BUNYAN, John. O Peregrino; com notas de estudo e ilustrações. São José dos Campos (SP): Editora Fiel, 2005, 263p.
11BONHOEFFER, Dietrich. Discipulado. São Leopoldo (RS): Editora Sinodal, 1984, 196p.
12PIPER, op. cit.



Autor: Juan de Paula Santos Siqueira
Pastor associado da Igreja Cristã Atos em São Gonçalo – Rio de Janeiro. Bacharel em Teologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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