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quinta-feira, 2 de junho de 2011

IGREJA - COMO É A IGREJA ATUAL FEITA PELO HOMEM



O Atual Estado de Coisas

Pergunto agora ao prezado leitor se o que a cristandade oferece hoje aos nossos olhos não difere completamente daquilo que a Igreja era no seu princípio. E a resposta não será difícil para qualquer indivíduo que tenha os olhos abertos e não deixe idéias preconcebidas obscurecem-lhe a mente. Não pretendo entrar no exame das causas que motivaram o estado de coisas atual. Quero simplesmente fazer vivificar esse estado em nossa mente. O paganismo e o judaísmo estão fora de questão agora. Nascemos na cristandade. Na grande maioria, fomos nela introduzidos pelo batismo. O que vemos à nossa volta e onde nos encontramos é a confissão cristã. Mas esta cristandade, esta confissão de fé? O que está compreendido sob este nome, que nos apresenta? Nada mais além de divisão e confusão.
Em lugar de um só corpo, vêem-se espécies de corpos diferentes, chamando-se todos de igreja, que, para se distinguirem uns dos outros, juntam a esse nome uma denominação. Há a igreja romana, que se intitula igreja católica ou universal, que reclama para si a sucessão apostólica e pretende ser a única e verdadeira igreja. Ao lado desta encontramos, no Oriente, a igreja grega, a igreja armênia, a igreja copta e a igreja abissíma. E como se tal não bastasse, existem ainda diversas e numerosas seitas dentro dessas igrejas. A parte destas que acabamos de mencionar, vêem-se ainda as numerosas igrejas genericamente chamadas de protestantes: anglicana, luterana, reformada, presbiteriana, congregacionais, batista, metodista, etc, etc, umas submetidas ao estado e outras separadas do seu jugo. Temos assim as igrejas nacionais e as igrejas independentes, ou livres, da França, na Suíça as do cantão de Vaud, de Genebra, de Neuchâtel — sem contar, por todo o lado, com as inumeráveis seitas diversas, todas de denominações diferentes, todas separadas por divergências muito profundas e reclamando, entretanto, cada uma para si, a posse da verdade absoluta!
Não é assim? E exagerado o quadro que acabamos de esboçar? Achamos, porventura, que isso tem alguma analogia com a Igreja, tal como a vemos no Novo Testamento? Existe nas Escrituras algum vestígio de uma sanção dada por Deus a um tal estado de coisas? E essa a unidade visível? Não! Essa é a confusão visível! Tomemos, por exemplo o caso de uma cidade — Genebra. Quantos corpos religiosos ou igrejas distintas veremos ali, fundados todos sobre princípios diferentes?! Suponhamos agora que uma carta apostólica fosse dirigida "à Igreja de Deus em Genebra". Onde ia parar? E se todos os cristãos praticantes se reunissem para tomar conhecimento dela, não seria para ouvirem palavras como estas: "Rogo-vos, porém, irmãos, pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que digais todos uma mesma coisa e que não haja entre vós dissensões; antes, sejais unidos, em um mesmo sentido e em um mesmo parecer" (1 Co 1:10)? E ainda: "Porque as obras da carne são manifestas, as quais são: prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, emulações, iras, pelejas, dissensões, heresias, invejas, homicídios, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, acerca das quais vos declaro, como já antes vos disse, os que cometem tais coisas não herdarão o reino de Deus" (Gl 5:19-21)?

A Igreja não é deste Mundo
Mas não é tudo. Como já recordei, e como era nos primeiros tempos, o Senhor disse de Seus discípulos: "Eles não são do mundo, assim como eu não sou do mundo" (Jo 17:14). Tal é o caráter da Igreja. Porém, que vemos nós? O que designa um grande número de corporações religiosas é o apoio que recebem dos estados e, por conseqüência, a dependência em que deles se encontram. Isto não é "ser do mundo"? Sem dúvida alguma que é! Mas a igreja romana tem pretensões ainda mais elevadas: quer dominar os reis e os príncipes — e, durante muitos séculos exerceu, de fato, essa prepotência. Entretanto, perguntamos: Querer -autoridade temporal será próprio daqueles que não são do mundo, dos que reivindicam o nome de Cristo, o nome dAquele que não quis ser Rei neste mundo (Lc 12:14; Jo 6:15, 18:36)? E que diremos do fausto mundano que impera nas igrejas romana, grega e anglicana; do fausto em que vivem os seus altos funcionários, quer numas, quer noutras — papas, cardeais, arcebispos e outros, morando em palácios, intitulando-se príncipes da igreja, recebendo vultosos emolumentos? Serão porventura esses os sucessores dos pobres pescadores Pedro e João? Isto é não ser do mundo?!
Se passarmos às igrejas protestantes não veremos nelas, é verdade, tais pretensões nem um tal cerimonial no culto. Mas umas estão sujeitas aos estados, que têm domínio direto ou indireto sobre elas — e isso é, de igual modo, associar-se ao mundo. Outras são regidas por constituições que promulgam para si própriaS, de uma forma ou de outra, como melhor lhes parece e acham conveniente — obra humana, sempre obra humana que, em qualquer dos casos acentua cada vez mais as divisões.
Dessas numerosas congregações independentes dos estados, mas não do homem, algumas formaram-se em tomo de uma doutrina particular ou segundo uma fórmula de organização especial; outras tiram o seu nome ou denominação do homem que as fundou. E mais uma vez volto a perguntar: É isto o que se lê na Palavra de Deus?

Uma Fé e não muitas Doutrinas
Se considerarmos a doutrina, que encontraremos nós? A Palavra de Deus nos diz: "Há uma só fé", do mesmo modo que diz: "Há um só corpo" (Ef 4:4-5). E isto o que se verifica? As igrejas romana e grega retêm algumas verdades ' vitais, mas sepultadas sob uma enorme quantidade de tradições e manchadas pelo contato de um culto idolatra. As igrejas protestantes têm as suas profissões de fé, mas valem-se tão pouco delas que muitas pessoas são de opinião que seria melhor não tê-las. Outras há que se pretendem bastante amplas ou liberais a fim de tudo abarcarem — e deixam, desse modo, amplo lugar ao equívoco, de tal sorte que delas podem ser membros duas pessoas de idéias inteiramente opostas sobre esse ou aquele ponto de doutrina! Nas cátedras, nas escolas de teologia, nos livros e nos jornais são ensinadas as doutrinas racionalistas em grau mais ou menos elevado e com mais ou menos sutileza. A autoridade das Sagradas Escrituras, a sua inspiração divina, é atacada até ao absurdo; a pessoa de Cristo, seja na Sua divindade suprema, seja na Sua humanidade sem mácula, é igualmente atacada de diversas maneiras; e as doutrinas da salvação pela graça, da expiação pelo sangue de Cristo são inteiramente postas de lado! E se ainda há quem retenha o são ensinamento, esses, poucos aliás, em vez de obedecer ao mandamento expresso nas Escrituras, que ordena ao homem que se aparte do mal, preferem continuar associados a ele!

Quem Chama ao Ministério é o Senhor
Se considerarmos o ministério, que veremos nós? Em que estado se encontra? Desejo, porém, e desde já, esclarecer que não pretendo atingir as pessoas. Existem muitos que são piedosos servos de Deus. Refiro-me apenas aos princípios. Pois bem! Que vemos nós nas diferentes corporações religiosas acerca do ministério? Em primeiro lugar um princípio geral prevalece por toda a parte: não se pode exercer o ministério sem se ter sido consagrado ou ordenado por um homem ou por uma corporação de homens—que eles mesmos, por sua vez, já foram ordenados por outros homens. E aí temos uma clerezia estabelecida na Igreja de Deus. Nas igrejas romana, grega e anglicana, esse clero forma toda a hierarquia, de que não encontramos vestígio algum nas Escrituras, e que desce desde o arcebispo aos simples funcionários eclesiásticos, sem contar, na igreja romana, aquele que tem a triste audácia de se colocar à cabeça e acima de tudo e de todos, intitulando-se vigário de Jesus Cristo. Sem ter chegado a tanto, o protestantismo, nas suas diversas denominações, não deixa de apresentar uma verdadeira clerezia nos seus corpos de ministros ou consagrados, e somente estes podem administrar o batismo e a ceia, não podendo, sejam quais forem os dons que tenham recebido de Deus, exercê-los, sem largos anos de estudos — não das Escrituras, que não têm entre eles senão um lugar muito fraquinho, mas de ciências, mais próprias para transtornarem a fé do que para estabelecê-la ou fortatecê-la. Em lugar do ministério no poder do Espírito, tem-se um ministério feito e preparado pelo homem, ministério este que, em lugar de se exercer livremente, segundo o dom da graça recebido, na única dependência do Verdadeiro Chefe da Igreja — CRISTO! — tem necessidade do controle e da aprovação do homem. E isto é tão certo que, se houvesse alguém numa congregação que tivesse recebido um tal dom, a não ser que fosse ministro ordenado ou consagrado pelos homens e para tal autorizado, ele não poderia abrir a boca! Não é isto rejeitar o Espírito (1 Ts5:19)? É porventura este o princípio segundo o qual, na Palavra de Deus, vemos atuar os obreiros do Senhor e em virtude do qual Paulo dizia de si mesmo: "Apóstolo [ou: enviado], não da parte dos homens, nem por homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai..." (Gl 1:1)? E, se por vezes, nalgumas congregações, se deixa um pouco de liberdade, isso constitui raríssima exceção. Os princípios e a maneira de atuar são tal como acabo de referir.
E que resulta daí? Vejamos. Um certo jovem quer dedicar-se ao ministério, como agora se diz. Talvez não possua nenhum dom; talvez nem sequer seja convertido, mas isso pouco importa. Ele será aceito da mesma maneira, sobretudo se puder pagar. Fará estudos de teologia, passará nos exames, defenderá uma tese, e, convertido ou não, sadio na fé, segundo as Escrituras, ou não, será investido num determinado grau acadêmico, tal como nas ciências humanas e, se o pedir, será ordenado ou consagrado e obterá um posto de sacerdote, de pastor, de padre (o que, com o tempo, poderá guindá-lo a bispo, a cardeal ou até Papa!) e tornar--se assim um condutor de almas, ensinando-as e alimentando--as da sã doutrina — que talvez ele próprio não possua, do mesmo modo que não possuirá os dons necessários para a sua cura de almas! Onde estará então, em tudo isto, a direção do Espírito de Deus? E onde está a submissão às Escrituras, à Palavra de Deus?
O que acabo de expor não será verdadeiro? Não é também verdade que em mais de um púlpito o pastor que o ocupa e deve edificar o rebanho é um incrédulo, não crê na inspiração divina das Escrituras, rejeita a divindade de Cristo e, em outros casos, se é mais ortodoxo, não é, porém, convertido? São poucos nas igrejas aqueles que mantêm perfeitamente a sã doutrina "criado", como diz Paulo a Timóteo  "com as palavras da fé e da boa doutrina" (1 Tm 4:6). E quem poderá afirmar que o mal não está em contínuo crescimento? E não causará tristeza ver aqueles que têm permanecido fiéis continuarem associados aos que transtornam a fé?
Outro fato bem surpreendente e que se relaciona com o ministério é este: um homem é estabelecido por um arcebispo, por um sínodo ou por qualquer outra autoridade humana, para ser o pastor de uma igreja. A partir daí ele passa a dizer: "A minha igreja", "o meu rebanho". Seria isto que Paulo dizia aos anciãos de Efeso? Ouçamo-lo: "Olhai, pois, por vós e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos [ou supervisores], para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue" (At 20:28). Eles, os bispos, são muitos — não um só! — estabelecidos pelo Espírito Santo, e não homem! E em nenhuma passagem das Escrituras se nos diz: a igreja ou o rebanho de Fulano de Tal. E este único homem, estabelecido sobre o rebanho, deve fazer tudo: ser evangelista, mestre, pastor, vigilante ou bispo, etc, quando, talvez, não tenha senão apenas um desses dons — ou mesmo nenhum!
A separação, ou antes, a divisão entre as diversas* denominações é tão distinta que, se mesmo um ministro de outra igreja se apresentar, não poderá falar na assembléia, sem autorização expressa (e muito menos ainda um simples cristão, um leigo, como se diz!).

Os Crentes são Membros do Corpo de Cristo
Outrora, quando uma alma tinha sido verdadeiramente convertida ao Senhor, essa conversão era razão suficiente para ela se juntar à Assembléia e ter o seu lugar à Mesa do Senhor — que era uma. Hoje, em alguns países, nascemos católicos ou protestantes, e se não quisermos permanecer no estabelecimento nacional (isto é, na igreja estadual), damos a nossa adesão verbal ou por escrito a uma profissão de fé e tornamo-nos membros de tal ou tal igreja, denominação inexata, porque as Escrituras não falam senão dos membros de Cristo (1 Co 12:27). E se se tratar da ceia do Senhor, na maior parte dos casos para sermos admitidos a ela temos de passar primeiro por uma instrução religiosa, depois da qual, convertidos ou não, seremos então admitidos à comunhão, sem discernir, na maior parte dos casos, o corpo do Senhor (1 Co 11:29).

O Culto segundo Deus
Poderia alongar-me ainda sobre o culto ou o que se entende por tal. Entre os católicos gregos ou romanos, o culto não é senão uma série ininterrupta de atos de verdadeira idolatria. Entre os anglicanos, um vão ritualismo. E entre a maioria dos protestantes de diversas denominações dá-se esse nome à pregação, acompanhada de algumas orações litúrgicas. Onde estará, pois, o culto em espírito e em verdade, o culto pelo Espírito, que caracteriza o cristão, sacrifícios espirituais de louvor e adoração, agradáveis a Deus por Jesus Cristo, oferecidos pelo conjunto do sacerdócio santo, de todos os crentes reunidos em volta da Mesa do Senhor (Fp 3:3; lPe 2:5; Hb 13:15; Jo4:23)? Uma pregação, por muito excelente que seja, e embora tenha o seu lugar entre os cristãos, não é o culto.

A Mesa e a Ceia do Senhor
Falei da Mesa e da Ceia do Senhor. Mas que confusão ainda existe a esse respeito! O ato mais doce para o cristão
  recordar a morte do Senhor,  até que Ele volte
— tornou-se, entre alguns, num ato de verdadeira idolatria e iniqüidade, apesar da grande solenidade com que é praticado. E entre outros — que tristeza! — é rodeado de terror, desviados do seu verdadeiro significado e feito um meio de graça. Uns, mesmo os que se dizem verdadeiros cristãos, não lhe concedem nenhuma importância; outros, espiritualizam-no. Alguns julgam que comungar uma vez por ano é suficiente. Em certas igrejas comunga-se quatro vezes por ano, nas festas, ainda que não se diga nada sobre este ponto no Novo Testamento. Outras igrejas pensam
que é bom tomar a santa ceia todos os meses. Num grande número de denominações, não há disciplina a respeito da ceia do Senhor. Convertidos ou não, incrédulos ou crentes, todos são admitidos a ela sob a sua própria responsabilidade, como se a igreja não tivesse nenhuma. Que se faz então das indicações das Escrituras? E isto não é tudo. Uma questão ainda mais séria e premente se levanta: No meio desta confusão e destas divisões, onde se encontra verdadeiramente a Mesa do Senhor? Pode ela achar-se em cada uma dessas igrejas, denominações e seitas tão divergentes?
Vemos, pois, de todos os pontos de vista, que o atual estado de coisas na cristandade difere completamente do que era no princípio e está em completo desacordo com os princípios que encontramos na Palavra de Deus, nossa única regra, nossa única e soberana autoridade. Há desacordo quanto à unidade, quanto à doutrina, quanto ao culto e quanto ao ministério. Que conclusão poderemos tirar disto? E que, por causas que não quero expor aqui, a Igreja, como corporação responsável sobre a Terra, faltou ao testemunho que devia prestar, caiu da sua primitiva posição, desviou-se dos caminhos do Senhor e caiu em ruína. Isto é um fato, caro leitor, um fato evidente. E, em lugar de procurarmos dissimulá-lo, desculpá-lo, não valeria infinitamente mais, não seria segundo a vontade de Deus, reconhecer o erro com dor e humilhação de coração, como outrora Daniel reconhecera e confessara a ruína do seu povo (Dn 9:4-8)? Não é este estado de coisas um mal tremendo, com total desvio daquilo que Deus estabeleceu?

A Ruína da Cristandade
Rogo ao leitor que observe que em tudo o que tenho dito de modo nenhum me referi a pessoas. Há nesta decaída e arruinada cristandade muitos queridos e bem-amados filhos de Deus, porque o Senhor, no meio da confusão que existe, prossegue o Seu propósito de graça de salvar almas e de conduzir muitos filhos Seus à glória (Hb 2:10). Mas esses filhos de Deus, que se encontram dispersos em todos os sistemas humanos de cristianismo, não são um só, como Jesus pediu. Há, sem dúvida, os que sentem a necessidade de realizar esta unidade. Daí tentativas como a Aliança Evangélica, onde, durante alguns dias do ano, se põe de parte de alguma maneira a cor particular de cada um; mas logo se volta ao seu sistema, retomando a sua bandeira, não fazendo mais do que afirmar a divisão, em detrimento da glória do Senhor. Não, a ruína existe, e qualquer esforço que se faça, seja aliança evangélica ou federação de igrejas, não a poderá deter, tanto mais que, nessas associações religiosas se deixam sempre de lado grandes corporações religiosas que fazem parte da cristandade.
Tem-se procurado justificar as divisões que existem na cristandade. Tem-se dito que o Novo Testamento não nos apresenta nenhuma regra de fé que devamos seguir e que, por conseguinte, o Senhor deixa aos cristãos o cuidado de se organizarem segundo os tempos, os lugares e as circunstâncias e que, entretanto, se tem a unidade na diversidade. Dizer que não temos nada no Novo Testamento para nos dirigir é enganarmo-nos de forma muito singular. Que se faz então de todo o ensinamento de Paulo relativamente à ordem na assembléia: "É, o que ordeno em todas as igrejas"; "como por toda parte ensino em cada igreja" (1 Co 7:17; 4:17)? Não estava presente ali o Espírito Santo para repartir segundo a Sua boa vontade? Havia então diversas organizações?
O Espírito Santo reunia as almas em volta do Senhor, operava na assembléia. O Deus de ordem e de paz achava-se ali presente, e as direções dos apóstolos também estavam ali, para guiar. Seria isto deixar a cada um a liberdade de se organizar como melhor lhe parecesse? Existe porventura nas Sagradas Escrituras uma simples passagem sequer que nos autorize a pensar que há algo de melhor do que era no princípio, que a obra do homem vale mais do que a obra de Deus? Não! É evidente que não! Quer o esforço para afirmar-lhe a unidade, quando, na verdade, as divisões subsistem, quer a tentativa de justificar essas divisões, não fazem mais do que dizer-nos: "A Igreja já não é o que foi, o que sempre devia ser. Falhou". Estamos no meio daquilo que é obra do homem, e o que ele faz é um mal, pois tende a transtornar a obra de Deus. No edifício cristão o homem introduziu madeira, feno e palha — e o resultado é a ruína que se vê. Vocês crêem que isso possa ser indiferente ao Senhor?
Mas, dir-se-á, não vemos efetuarem-se obras magníficas em nossos dias? Não se prega o evangelho em maior escala do que nunca e a Palavra de Deus não é espalhada em profusão? Bendito seja Deus porque isso acontece. A maldade do coração natural do homem, o fato de ele corromper tudo o que lhe é confiado, não impede, como já disse, a graça de Deus de salvar almas e de, para tal fim, operar pelo Seu Espírito. Graças a Deus, porque a Sua bendita graça ainda reina nos tempos atuais, mas isso em nada atemia o fato da confusão, da desordem e da ruína na igreja. A igreja não respondeu à oração de Jesus: "para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu, em ti; que também eles sejam um em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste" (Jo 17:21), de maneira que já não é o seu testemunho diante do mundo que glorifica a Jesus e ao Pai. E, se existem almas salvas, apesar da ausência desse testemunho, elas o são por efeito da soberana graça de Deus. E não se diga: "Que importa se, ao fim e ao cabo, as almas são salvas?" Seria desconhecer, de forma muito singular, o que tende para a glória do Senhor. A maneira que Ele julga o mal nas igrejas (Ap 2 e 3) mostra-nos bem que isso Lhe não é diferente.

A Evangelização segundo Deus
Sim, bendito seja Deus, existe uma pregação do evangelho e almas que se salvam, mas quanto mais eficaz não seria a evangelização no mundo se fosse apoiada no testemunho da Igreja! E que diferença na maneira de anunciar o evangelho outrora e hoje! Naquele tempo apresentava-se simplesmente Cristo e a Sua obra, e as almas, feridas de compunção, vinham a Ele e eram salvas. Agora procura-se agir sobre os sentimentos e, não raro — sabemo-lo bem —, por meios puramente humanos e totalmente fora das Escrituras, tendo quase sempre em vista um resultado meramente filantrópico, em vez de salvação das almas e da glória de Cristo.

Aonde Devemos Ir frente a Confusão Atual?
Outro traço igualmente surpreendente da confusão que reina por toda a parte, do estado de ruína em que nos achamos, do mal que invadiu a cristandade é o seguinte: uma alma foi salva; apresenta-se muito seriamente diante de Deus e interroga-se: "Aonde hei de ir para render culto a Deus? Com quem me reunirei?" Encontra-se essa alma-* perante trinta e seis denominações diferentes, entre as quais precisa escolher. E, se as examinar com retidão e à luz das Escrituras, achará que todas elas, ao fim, não passam de instituições humanas, onde freqüentemente os princípios divinos são sacrificados aos interesses e egoísmo humano. Que ruína! Parece necessário associarmo-nos com o mal para não ficarmos sós!
Procurei apresentar aos leitores como era no princípio, quando a Igreja andava nos caminhos do Senhor, e como é agora. Por mais de uma vez se nos impôs a seguinte conclusão: isto é um estado de ruína total, é a desobediência ao Senhor, é o mal em todas as suas formas. A questão que agora se põe é: "Que temos de fazer, num tal estado de coisas, para andarmos segundo a vontade de Deus?" Mas antes de procurar resolvê-la, eu gostaria de mostrar que essa ruína da igreja já tinha sido anteriormente anunciada na Palavra de Deus. Isto não só confirmará a verdade do que sentimos, mas também nos ajudará a encontrar os recursos que Deus tem reservado para os que desejam andar em fidelidade e obediência ao Senhor, apesar do atual estado de coisas em que vivemos.


Fonte: A. Ladrierre - O Caminho de Deus em Tempos Difíceis






Pesquisa: Pastor Charles Maciel Vieira

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